Olga*
Meu pai nasceu na Tchecoslováquia, foi criado na Alemanha e veio para o Brasil com 30 anos. Minha mãe nasceu na Alemanha, foi criada na França e veio para o Brasil com 16 anos. Ela era professora de francês na Aliança Francesa, mas em casa a gente falava o idioma alemão. Eles se conheceram em Rolândia, onde morava a família de minha mãe. Nasci em Rolândia, norte do Paraná. Tenho três irmãs e um irmão. Sou a segunda filha na família.
Meu
pai foi convidado a se retirar da Alemanha por não ser alemão e estar
participando de passeatas contra Hitler. Ele saiu fugido e veio pela Caritas.
Sempre teve uma cabeça maravilhosa. É engenheiro agrônomo e não teve problema
de emprego porque tinha muita terra para medir no Paraná. Agora é falecido.
Minha mãe é aposentada e dá aulas particulares de francês em casa. Minhas irmãs
estão casadas, com filhos, e esperando que eu deixe essa vida louca que elas
não entendem.
Meus
pais sempre foram pessoas maravilhosas. Meu pai foi quem mais me influenciou.
Era liberal, anárquico, inteligente, tinha ideias fantásticas. Quando tive o
meu primeiro relacionamento, liguei para ele e disse que estava para casar, mas
que o cidadão era divorciado, uma coisa assim. Ele disse: “Que ótimo! Pode
deixar que eu faço a cabeça da sua mãe.” Eu devia ter uns 20 e poucos anos.
Minha família é católica praticante.
Não
fui criada para casar e ter filhos. Quando uma amiga da minha mãe perguntava se
eu já tinha namorado ela respondia: “Eu não estou criando minhas filhas para o
casamento. Estou criando primeiro para que tenham uma profissão, depois elas
resolvem se querem casar ou não”.
A
minha irmã mais velha casou cedo, mas continuou estudando, contra a vontade do
marido que achava um absurdo ela ir para a Faculdade estando grávida. Ela
sempre fez questão de trabalhar. Outra irmã é mãe solteira. A única que não
trabalha fora é a que mora na Alemanha. Eu nunca tive este instinto materno e o
fato de não ter tido filhos nunca me afetou. Estou casada, meu marido se aposentou
há pouco tempo. Ele ainda sente ciúmes do meu trabalho, mas já não briga porque
sabe que não adianta. O fato de estarmos vivendo com tantas pessoas não quer
dizer nada, em relação ao meu casamento.
Aviação e família
Minha família mudou-se para Curitiba e eu
morei lá até entrar para a aviação. Meus familiares continuam morando em
Curitiba. Só uma irmã que se casou com um alemão e mora em Frankfurt. A minha
vida em Curitiba era muito certinha e muito chatinha. Eu estudava meteorologia
e queria ser piloto, tirar o brevê, mas havia aquela história de que mulher não
tinha nenhuma oportunidade de trabalho nesse setor. Nesse interim apareceu o
anúncio para candidatas a aeromoças e resolvi me inscrever.
Eu
tinha um tio que trabalhava na Varig e me interessava pela aviação, mas não
tinha ideia do trabalho de aeromoça. Tinha uma amiga, cujo pai tinha sido
piloto na II Guerra Mundial, que estava fazendo o curso de piloto. Fui com ela
até o Aeroclube e me interessei pelo voo.
Quando
entrei para a aviação, o perfil da aeromoça ainda não era muito definido. Havia
requisitos: idade mínima, peso etc. Já tinha me apresentado aos 17 anos, depois
de ver o anúncio no jornal, mas eles disseram que eu era muito nova e que tinha
que esperar pelo menos um ano. Quando estava com 18 anos já tinha outras
ideias, nem estava mais pensando no voo. Então eles me chamaram porque eu
falava alemão e isso era importante para a empresa. A minha redação em
português era péssima e mesmo assim me aceitaram.
Entrei
com 18 anos quando a idade mínima era 21. No meu passaporte constava que eu
viajava sob a responsabilidade da empresa. Entrei com a condição de estudar
inglês e estudei. Por isso não entendo as reivindicações de colegas que querem
ser promovidos sem dominar esse idioma. Acho que o principal numa profissão
dessas é ter fluência em outras línguas além do português.
Um
dia desses queriam que eu assinasse um abaixo-assinado pedindo à empresa para
tirar a exigência do conhecimento do inglês. Eu me recusei. Muito ao contrário,
acho que a empresa ainda deve acrescentar a exigência de outros idiomas para
quem quer voar nas linhas internacionais.
Fiz
os testes de seleção no Paraná. Meus pais não se opuseram. Meu pai achou que eu
não ia ficar muito tempo, mas estou aqui até hoje. Ele disse que eu mudava de
ideia com facilidade e que essa ideia de entrar para o voo também seria
passageira.
Durante muitos anos eu visitava a minha
família quase todos os meses. Achava que eles precisavam de mim para serem
felizes. Eles ligavam para mim: “Olha, o seu pai está deprimido, seria bom que
você viesse.” Havia essa cobrança por parte da família. Isso com 15 e até 20
anos de voo. Eu vivia muito em função da minha família. Toda hora tinha que
estar em Curitiba e me sentia na obrigação de fazer isso. O relacionamento era
muito estreito com a família e também com os amigos e meu tempo disponível era
dedicado a eles.
Depois
comecei a fazer análise. Meu analista me chamou a atenção para o desgaste que vinha
tendo e que eu não estava cuidando da minha própria vida. Vivia levando
presentes para meus familiares e coisas assim. Ele me fez ver o quanto eu
estava me sacrificando em função deles. Depois, deixei de ir, comecei a me
entender e a me cuidar. Agora vou em média duas vezes por ano. Segundo o
analista, a família escolhe um Cristo e você aceita fazer esse papel.
Curso de Comissários,
primeiros voos, perfil profissional
Quando
entrei para a aviação eu não sabia nada sobre a profissão. Naquela época o tempo
de descanso durante o voo não existia. A gente não era contratada para
“descansar” no avião, diziam, mesmo que o voo durasse mais de 15 horas! Durante
o curso, eles não sabiam como conduzir e informar os comissários sobre muitas
coisas que faziam parte da profissão. Falavam muito da sequência do serviço de
bordo...
Não
gostei nada dos meus primeiros voos. O primeiro foi uma conexão de voo
internacional. Colocaram-me uma bandeja na mão e me mandaram passar o suco. A
instrutora estava no voo, mas acompanhava um bebê desacompanhado. Estava lá,
envolvida com mamadeira e fraldas. E eu fiquei ali sem saber o que fazer.
Comecei a trabalhar muito nova, sem saber direito o que estava fazendo,
exatamente como uma garota que se torna mãe aos 15 anos. Fui crescendo junto
com a profissão. As normas foram aparecendo com o tempo.
Hoje
já não sei mais qual é o perfil do profissional. Houve uma época em que esse
perfil ficou mais definido. Acho que o perfil ideal, se é que existe, está
desaparecendo. Quando entrei para o voo, por exemplo, não podia casar, não
podia ter filhos, não podia fazer quase nada. Eram todas umas santinhas dando a
volta ao mundo. Coisa estranha... Então o mulherio casava escondido, tinha
filho escondido. Eles não podiam aparecer!
Cantadas
As
cantadas existiam e algumas investidas eram fortes. Cito o exemplo de uma
colega nossa que chegou a ganhar de um tio um revólver para se proteger nos
pernoites. Naquela época ela era uma das poucas comissárias na tripulação e
andava sempre com a arma na mala. Um dia teve que fazer uso. O colega,
tripulante técnico, bateu na porta do quarto dela e quando ela abriu a porta
ele colocou o pé e com a força conseguiu entrar no quarto. Ela foi se
aproximando da mala e conseguiu pegar a arma. Apontou a arma para ele e mandou-o
sair imediatamente. O cidadão saiu apavorado!
Os homens achavam que as comissárias também
estavam lá para isso mesmo, mas com o tempo foram vendo que não era bem assim. Essas
colegas, as pioneiras, enfrentaram uma barra bem mais pesada. No meu caso,
sendo a mais nova, sempre despertei o maternalismo e o paternalismo por parte
dos colegas. Eles se preocupavam comigo em todos os sentidos. Lembro bem disso.
Recebi
muitos cartões de passageiros, mas cantada insistente foi apenas um telefonema
que recebi no quarto do hotel. Estou procurando saber onde você se hospeda
há três horas! Você é um amor! - disse ele. Quem está falando?
- perguntei. O seu passageiro mais simpático! - ele respondeu. Não
consigo me lembrar. - eu disse. Aí ele me convidou para jantar, mas eu
inventei que um colega da tripulação estava fazendo aniversário e todos iam
sair juntos para comemorar. Depois até me arrependi. Fiquei lembrando que ele
era realmente muito simpático, uma pessoa bem suave. Mas a gente nunca sabe...
Tive
um envolvimento superficial com um comandante, mas para mim era tudo muito
esquisito a maneira dele ser e pensar, por causa do uniforme e das faixas. Ele
próprio fez a minha cabeça para não me envolver com ninguém mais da aviação.
Conscientemente, conversava comigo e dizia que eu não devia confiar e desfiava
os motivos ou “qualidades” dos aviadores. Hoje, eu podia ser esposa de
comandante, quem sabe, mas com essas advertências que recebi essa possibilidade
desde cedo ficou descartada.
Profissão X Vida doméstica
As
outras mulheres que não são da aviação não fazem ideia do que é administrar uma
casa na nossa profissão. Não sabem o que é iniciar uma tarefa, parar, voar e
voltar para terminar. Isso porque a mulher da aviação não deixa de fazer todas
as tarefas da casa. O homem, quando fica em casa, não lava louça. Se o casal
tem filhos, ele ainda consegue tomar conta ou supervisionar as coisas na
ausência da mulher.
Outro dia, uma colega me contou que ao chegar
de viagem encontrou um aviso escrito na porta do banheiro: “Atenção, não tem
papel higiênico!”. Ou seja, quem se deu ao trabalho de escrever o aviso não se
deu ao trabalho de colocar um novo rolo de papel higiênico! Nem o banheiro eles
sabem abastecer. E assim a mulher é sobrecarregada nas mínimas coisas. Lá em
casa, a louça tem aparecido lavada, mas as panelas ficam lá, cheias de água e
detergente, me esperando. Se não fosse por causa das baratas acho que não
existiria nem a preocupação com o detergente. A loucinha leve está sendo lavada
por causa dos escândalos que faço quando chego de viagem. É para evitar o
escândalo, que a loucinha está sendo lavada, não para me ajudar nas tarefas da
casa. Ele acha que eu viajo porque quero e que devo cuidar das tarefas
domésticas porque sou mulher. Mas acho que duas pessoas vivendo juntas deveriam
dividir igualmente as tarefas da casa. A mulher ainda é muito sobrecarregada.
Ela é quem faz, resolve, decide, dentro de casa e fora de casa também.
Realidade X ilusão
Muitas
comissárias acham que por se hospedarem em hotéis quatro estrelas, a vida que
levam é um luxo. Elas não conseguem colocar o pé no chão e vivem com angústia
essa dupla realidade. Falta preparo psicológico e muitas acabam entrando de
licença psiquiátrica. A empresa não as prepara para as contradições da vida
profissional. Desde que entrei na aviação, sempre cobrei o acompanhamento de
psicólogos para muitos problemas vividos por colegas. Eu sinto que existe por
parte da própria empresa o medo de conhecer o real perfil do profissional do
voo. Ela vai deixando como está para ver como fica. Sentimos falta de uma
chefia mais consistente, consciente e mais decidida.
Preparação para as viagens
Nunca
gostei de preparar as malas, nem de sair de casa para viajar. Em termos
emocionais essa parte é muito difícil para mim, mas depois que saio de casa
tudo fica mais fácil. Houve uma época em que não queria mais voar, pensava até
em sair da aviação e fui fazer terapia analítica para saber o que estava
acontecendo comigo. Interromper o que estava fazendo em casa e sair para voar
era muito difícil. Ainda mais porque vivemos viajando e quando acho que estou
recuperando o meu equilíbrio, já está na hora de sair outra vez.
Eu
tinha uns 10 ou 12 anos de voo quando busquei ajuda psicológica porque eu
queria voar, mas o fato de sair de casa e ir para o aeroporto estava muito
difícil. Muitas vezes eu queria que o táxi quebrasse no caminho para ter uma
desculpa, ligar para a Escala de Voo e dizer que não poderia fazer aquele voo.
Queria que o elevador ficasse trancado, assim eu ficaria presa no elevador e
pediria para alguém ligar para a empresa e dizer que eu não teria tempo de
chegar ao aeroporto e fazer o voo. Na minha cabeça sempre havia a expectativa
de faltar e ter uma justificativa para a empresa. E sentia uma grande alegria
quando o voo atrasava ou era cancelado. Se tivesse que sair horas depois ou até
no dia seguinte eu saía mais animada porque assim tinha conseguido ganhar mais algumas
horas antes de entrar num avião.
Na
psicoterapia fui me conscientizando de que essa passagem era difícil, mas que
eu gostava do meu trabalho, pois quando estava bem eu gostava do que fazia. Era
uma questão de equilibrar o tempo em casa e o tempo no trabalho. Esse problema
estava relacionado com a Escala de Voo. Durante o voo e até nos pernoites eu me
sentia bem.
Ao me preparar para viajar, não dou atenção
para mais nada. Deito por algumas horas e mesmo que não durma sinto necessidade
de descansar e de me isolar. Fico quase neurótica porque sei que vou passar
toda a noite em claro, trabalhando. Depois levanto, tomo banho, seco o cabelo,
visto o uniforme e assim faço o ritual de passagem, em silêncio e no isolamento.
Retorno dos voos
Quando
chego, depois de um voo, estou sempre muito cansada e irritada. A gente passa
horas e horas dentro de um avião se controlando e quando chega está a ponto de
explodir. Lá em casa eles já sabem, no dia em que eu chego estão proibidos de
me falar qualquer coisa negativa que tenha acontecido. Qualquer problema que
houver, que dependa de mim, fica para o dia seguinte.
Dependendo
do voo, a minha irritação dura algumas horas ou mesmo dias. Sinto-me péssima,
preciso descansar, dormir, deixar a irritação passar, até me sentir melhor, até
me sentir gente outra vez. Mas, ao mesmo tempo, sinto-me culpada, pois já
fiquei alguns dias fora do convívio familiar, alguns dias sem dar
prosseguimento à minha própria vida. É sempre um dilema, que só passa com o
descanso. Há colegas que chegam de voo e logo se envolvem com as questões do
cotidiano. Eu não consigo! Se não descansar, fico quase maluca!
Consumismo, atividade
paralela
Em
termos de alimentação eu sou consumista, vou ao supermercado no exterior e
compro muita coisa para uso familiar, porque a qualidade é superior e o preço é
igual ou inferior. Mas em relação a outras coisas não sou.
Nunca
fiz muamba. Como não tenho filhos, não tenho muitos gastos com a família e
nunca fiquei tentada em comprar e vender para ganhar mais dinheiro. Eu não
tenho essa veia comercial. Até admiro a correria de muitos colegas que fazem
isso e ainda enfrentam a alfândega. Mas fico irritada quando tenho que abrir minhas
malas na alfândega porque eles acabam pegando as minhas coisas que são para uso
pessoal.
Estudo de idiomas
Dediquei meu tempo ao estudo de idiomas.
Comecei estudando inglês, pois alemão eu já falava. Depois estudei francês. E
os idiomas precisam ser estudados constantemente porque na aviação a gente os
usa muito pouco, dentro do avião inclusive. Nós falamos muito pouco com os
passageiros. E os tripulantes que nos pernoites saem em grupo acabam falando só
entre eles, em português. Sinto que, até em alemão, quando falo com a minha
mãe, as palavras começam a faltar por causa do pouco uso. É preciso dois ou
três dias de convívio para ter a fluência novamente. Também estudei italiano,
sempre com aulas particulares porque na nossa profissão é difícil conciliar os
horários nos cursos regulares. Estudei espanhol no tempo em que fiquei baseada
em Madri.
Relacionamento com os
colegas nos pernoites
O
meu relacionamento com os colegas sempre foi superficialmente bom. Nunca
entendi essa coisa de transformar o grupo que está voando comigo em uma
família. Essas reclamações que os colegas fazem de que nos pernoites ninguém
está saindo junto, eu não entendo. As pessoas que trabalham em outras
atividades não saem do trabalho e vão se reunir com os colegas depois. Cada um
vai cuidar da sua vida. Sempre encarei a minha profissão como um trabalho e não
como uma distração.
No
início, até tive um maior entrosamento, quando era mais jovem e com poucos anos
de aviação. Depois, a gente passa para os voos internacionais e muita coisa
muda. Os voos são muito cansativos. Nunca entendi como muitos colegas têm tanta
energia para sair e fazer tantas coisas nos pernoites. Sair correndo, fazer
isso e aquilo, ir jantar no dia da chegada... Eu vou dormir, buscar o meu
repouso. Sempre achei que depois de uma noite inteira de trabalho, o que mais
preciso é de descanso. Sempre dormi muito e bem. Se acordo no meio da noite,
leio até o sono voltar novamente. Nunca tive problema de fuso horário, nem no
Brasil, nem no exterior.
Nos
pernoites, passo o meu tempo com muita leitura. Não faço questão de ir a
grandes restaurantes porque acho que essas orgias gastronômicas não estão com
nada e me cansam muito. Então, para o pernoite, eu levo a minha leitura. A não
ser quando vou para Frankfurt, onde visito meus familiares. Também gosto de
sair, andar um pouco, visitar museus e boas exposições, quando tenho tempo. Mas
programações em shoppings e restaurantes não me interessam.
Questões de saúde
Quando
entrei na aviação, tinha problema de sinusite. No primeiro exame de saúde no CEMAL
fui reprovada. Fiz tratamento e fiquei curada. No geral, procuro cuidar da
minha saúde. Tomo vitaminas, faço tratamento com homeopatia quando preciso.
Quando surge um sintoma, procuro um médico, para ver o que é e me tratar.
Sempre
tive problema para usar maquiagem, mesmo quando tentei usar produtos
antialérgicos. Começo a ficar com problema de inchaço. E também não posso usar
lentes de contato, tenho alergia.
Nosso ambiente de trabalho é adverso e nós
precisamos nos cuidar. Minha maior preocupação, em termos de saúde, é não
perturbar os colegas, se por acaso ficar doente num pernoite. Não gosto de
incomodar nem de ficar dependente. Por isso me cuido bastante. Ficar fora de
casa e ainda doente não deve ser fácil.
Escala de Voo
Quando
pego a Escala de Voo, nem olho. Dobro o papel e guardo na bolsa até chegar em
casa. Aí dou para o meu marido dar uma olhada. Ele olha, examina, pensa e diz:
“Olha, não está muito ruim”. Eu pergunto: “Tem um fim de semana de folga, pelo
menos?”. Então ele diz quais são os voos e tudo o mais que vou ter que fazer
naquele mês. A pior coisa é pegar a Escala de voo!
Apesar
disso, estou satisfeita com a profissão que escolhi e nunca pensei em fazer
outra coisa na vida. Meu analista disse que a vida na minha casa era tão
certinha que a única coisa que eu fazia era procurar fugir do certinho. Cada
viagem é uma fuga! Mesmo que me irrite sair de casa, eu não deixo de sair.
Aposentadoria
Estou
com 49 anos e gostaria de sair do voo aos 50. Mas pago minha aposentadoria
suplementar pelo AERUS e tenho que esperar até os 55 anos, pois não aceito sair
sem o meu salário integral depois de tantos anos de trabalho na aviação! Acho
que isso está errado. Com 30 anos de voo eu já deveria estar me aposentando.
Estou esperando que surja a oportunidade de fazer algum acordo com a empresa.
Eu não gostaria de ficar na aviação até os 55 anos, mas com 70% do salário eu
não saio. Sou independente, financeiramente, desde os 18 anos e não consigo
aceitar me aposentar e ganhar menos.
O que vou fazer depois?
Nem
sei! Vai sobrar muito tempo... Dizem que quando a gente tem muito tempo
sobrando não consegue se organizar... Quero fazer pintura, voltar às aulas de
dança e só. Viver o dia a dia, ler muito, fazer comidinhas, todas essas coisas
que agora a gente faz sempre correndo e até com certo nervosismo. Quero curtir
esse dia a dia e está na hora de fazer isso.
*Olga (pseudônimo) estava com 49 anos e 30 de voo quando concedeu
esta entrevista, em 1997, em um pernoite na cidade de Madri (Espanha).
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