segunda-feira, 16 de junho de 2014

Resultado da PESQUISA (Parte3)

Resultado da PESQUISA (Parte3)
(Respostas ao Questionário - 1995)

XVI – É possível conciliar a vida familiar com a vida profissional?
Na Varig, 25% das mulheres que responderam ao questionário diziam conseguir conciliar a vida familiar com a vida profissional. Mas a grande maioria encontrava muita dificuldade. Seguem as respostas que vieram acompanhadas de justificativa:
1- Sim, consigo conciliar. Sou solteira e não tenho filhos. (54 anos, 33 de voo)
2- Sim, consigo. Sou casada, tenho uma filha e conto com a ajuda de minha família. (52 anos, 34 de voo)
3- Sim, senão não estaria completando 26 anos de aviação com filhos lindos e saudáveis. Sou solteira e tenho dois filhos, mais o da empregada que nasceu com a gente. (49 anos, 26 de voo)
4- Atualmente sim, pois meu filho já é um rapaz e tenho estabilidade emocional com meu companheiro. A vida social já é mais difícil. (46 anos, 27 de voo)
5- Consigo, a duras penas, conciliar a vida familiar. A social quase nunca. Sou casada e tenho dois filhos, um rapaz de 18 anos e uma moça de 15. (46 anos, 25 de voo)
6- Sim, a familiar, na medida em que estou praticamente só. Sou solteira. Quanto à vida social sempre falhamos em alguma coisa, mas contamos com a compreensão dos amigos e participamos quando podemos. (46 anos, 16 de voo)
7- Atualmente, não consigo. Sou solteira e estou sempre aguardando a chegada da escala, mas esta deixa muito a desejar. (45 anos, 22 de voo)
8- Não muito. Na verdade não tenho vida social. Sou solteira e tenho um filho de 14 anos. (43 anos, 19 de voo)
9- É difícil conseguir a harmonia. Sou casada e tenho um filho de quatro anos. (42 anos, 21 de voo)
10- Eu tento, mas confesso que vivo cansada e com sentimento de culpa por não poder, às vezes, concluir o número de tarefas que tenho para executar.  É muito desgastante. Sou casada e tenho dois filhos. (42 anos, 18 de voo)
11 - Conciliar é impossível. Sou casada e tenho uma filha de cinco anos. (42 anos, 17 de voo)
12- É difícil. Sou separada e tenho duas filhas. (42 anos, 16 de voo)
13- É quase impossível, mas meu companheiro é bem consciente e me auxilia. Sou oficialmente solteira e não tenho filhos. (42 anos de voo, 15 de voo)
14- A vida pessoal eu resolvo, mas a social fica a desejar, pois não posso participar de quase nada. Vivo em função da escala de voo. Sou solteira e não tenho filhos. (42 anos, 14 de voo).
15- É difícil, mas com a ajuda do marido e da empregada, conseguimos ter uma vida familiar razoável. Sou casada e tenho uma filha. (41 anos, 19 de voo)
16- Sim, quase sempre eu consigo. Sou oficialmente solteira e não tenho filhos. (41 anos, 15 de voo)
17- É difícil. A escala está bem apertada. Sou solteira e não tenho filhos. (41 anos, 15 de voo).
18- Tento conciliar e vou tentar sempre. Sou casada e tenho dois filhos, 13 e 6 anos. (40 anos, 19 de voo)
19- Quando a escala está boa, eu consigo conciliar. Sou solteira e não tenho filhos. (40 anos, 15 de voo)
20- Eu tento conciliar. Sou oficialmente solteira e tenho dois filhos. (39 anos, 16 de voo)
21- Tento conciliar, mas é difícil. Sou casada e tenho um filho. (38 anos, 16 de voo)
22- Sim, na medida em que aproveito o máximo das minhas folgas para ficar com a família e os amigos. A escolha da profissão foi minha, a empresa me paga pelo meu trabalho e eu tento viver em função disso. Já me habituei. Sou casada, tenho um filho de 11 anos e uma filha de quase três. (38 anos, 15 de voo)
23- Sim, consigo conciliar, mas “faço das tripas, coração”. Sou casada e tenho duas filhas, uma de sete e outra de cinco anos. (38 anos, 11 de voo)
24- Às vezes, considero que faço “milagres”, pois tenho uma filha de 14 anos que criei praticamente sozinha. Minha família vive no Sul e eu não tenho parentes no Rio.  Sou divorciada. Infelizmente o pai de minha filha é uma pessoa muito ausente na educação e formação da menina, o que dificulta as coisas. Mas me considero bem sucedida, pois ela tem uma “ótima cabecinha” e foi sempre uma criança saudável, o que facilitou muito para mim. (37 anos, 19 de voo)
25- Não consigo. Sou solteira, não tenho filhos. (37 anos, 15 de voo)
26- A conciliação da vida pessoal com a profissional é imposição da própria profissão, contudo mexe muito com o emocional. Sou solteira e não tenho filhos. (37 anos, 15 de voo)
27- Consigo pela metade. Sou casada e tenho uma filha. Estou passando por um momento pessoal muito difícil. Minha filha tem um problema de saúde muito sério (meningite). Às vezes, fica difícil sair para um voo longo e deixá-la em casa com a babá. É muito conflitante, pois ela depende do meu salário para o tratamento médico que faz. Às vezes, fica difícil sorrir, mas esse é um problema só meu. Vai passar. (37 anos, 15 de voo)
28- Tento fazer o melhor que posso, mas volta e meia fico impedida de participar de momentos importantes. Meus pedidos de folga são sempre atendidos, mas há coisas que não dá para planejar com muita antecedência. Sou casada e tenho uma filha. (37 anos, 12 de voo)
29- Tento conciliar, mas minha vida social é pobre. Sou solteira e não tenho filhos. (35 anos, 9 de voo)
30- Esta profissão é muito desgastante fisicamente, o que atrapalha muito a realização dos aspectos da vida pessoal no dia a dia. Sou solteira e não tenho filhos. (35 anos, 9 de voo).
31- Hoje é impossível conciliar qualquer coisa com o voo. A chefia e a escala não gostam quando os lembramos da Martha Novis. Quando ela trabalhava na Escala nós trabalhávamos satisfeitos e tranquilos. Tínhamos de 70 a 80 horas de voo por mês e voávamos com calma e serenidade, o que não ocorre nos dias de hoje. A folga nas rotas nacionais é sentida de forma diferente das folgas nas rotas internacionais. A lei que regulamenta a nossa profissão não permite que tenhamos descanso. Noites de trabalho, nos voos internacionais, não são compensadas com 12 horas de descanso. Sou casada e tenho uma filha. (34 anos, 15 de voo)
32- Não. O tempo para mim é como um cobertor muito curto: algum setor da minha vida fica sempre a descoberto. Oficialmente sou solteira, não tenho filhos. (31 anos, 9 de voo)
33- Concilio, muito precariamente. Trabalho praticamente todos os finais de semana. Sou solteira e não tenho filhos. (31 anos, 8 de voo)
34- É impossível conciliar. A Escala não coopera, parece que tem como ideal ver o profissional frustrado. Não facilitam trocas de voo e dificilmente conseguimos assumir nossos compromissos familiares ou sociais, o que nos causa muita angústia e desequilíbrio emocional. Sou divorciada e tenho uma filha. (30 anos, 10 de voo)
35- Concilio com muita dificuldade. É preciso ter jogo de cintura, marido independente, compreensivo e confiável, receber as “folgas” quando solicitadas à escala, para fazer as provas na faculdade (ah! esqueci, professores tolerantes com as faltas e colegas de classe, vulgarmente chamados de “procuradores” para emprestar cadernos), para ir a casamentos, festas, aniversários, emendar feriados, etc. (30 anos, 10 de voo) 
36- Minha vida pessoal é bastante tranquila. Visito minha família, no Sul, três a quatro vezes por ano. Encontro meus amigos aqui no Rio e/ou em São Paulo, sempre que posso. Para conciliar meus horários de voo com a faculdade, tenho que redobrar meus esforços, mas no final tudo tem dado certo.  Sou divorciada e não tenho filhos. (30 anos, 9 de voo)
37- Na minha situação é muito difícil conciliar. Sou casada e tenho dois filhos. (29 anos, 8 de voo)
38- Ultimamente não, pois a nossa escala pensa que somos robôs e só vivemos para trabalhar, sem se preocupar em saber que necessitamos ter uma vida paralela que nos dê condições de exercermos nosso trabalho da melhor forma possível. Não sendo assim, o grau de insatisfação é muito grande. Sou casada e não tenho filhos. (29 anos, 8 de voo)
39- Muito raramente, eu consigo. Acho que isso acontece com muitos colegas; as pessoas conhecidas deixam de ligar, alegando que “eu nunca estou em casa”. Acabo ficando no esquecimento. Sou casada e tenho um filho. (29 anos, 8 de voo)
40- Não consigo ter vida social. O que facilita o convívio com meu marido é que ele também é da aviação. Temos maior facilidade de nos encontrarmos em outros lugares (quando um ou outro está trabalhando, e usamos o “passe”).  Não tenho filhos. (28 anos, 8 de voo)
41- Consigo conciliar a vida familiar porque meus pais me apoiam completamente, apesar da saudade que sinto deles quando tenho que ficar longe de casa. Mas a vida social é o meu maior problema. Sou solteira e não tenho filhos. (24 anos, 2 de voo)
Na Rio-Sul, 45% das Comissárias disseram conciliar a vida familiar com a vida profissional. Na Transbrasil, 60% também afirmaram que conseguiam conciliar. Não justificaram suas respostas
Na Vasp, 80% das Comissárias diziam não conseguir conciliar a vida familiar com a profissional. Não justificaram suas respostas.  

 XVII- O cuidado com os filhos...
Quem se ocupa dos filhos das Comissárias de Voo, quando elas estão trabalhando? Como eles reagem? O que elas sentem?
O cuidado com os filhos é o aspecto mais complicado da vida das mulheres que são comissárias de voo e mães. A maternidade é uma fonte de grandes alegrias e também de muito sofrimento e culpa, pois elas passam muito tempo ausentes de casa, longe dos filhos. Em suas ausências, outras pessoas se ocupam deles: O pai (marido) e uma empregada é a combinação mais comum. A avó, que pode ser a mãe ou a sogra da comissária. Uma babá, ou uma empregada, quando os familiares moram longe, também é a solução possível. Cada uma, à sua maneira, enfrenta este problema e deposita nas mãos de Deus a proteção de sua família e de sua própria vida. Registro as respostas de muitas mães:
1- Agora, cada um cuida de si. Antes, minha cunhada e minha mãe, cuidavam de minha filha, quando ela era pequena.  (52 anos de vida, 34 de voo)
2- Hoje, com 17 anos, minha filha cuida de si mesma, nas minhas ausências, e reage bem. (51 anos, 20 de voo)
3- Antigamente, era o pai e uma pessoa de confiança. Hoje, é só a pessoa de confiança. Sentimos saudades, uns dos outros. Mas não gostaria de ser uma dessas mães que ficam 24 horas com os filhos, vendo defeitos e gritando com eles o dia todo. (49 anos, 25 de voo)
4- Antigamente era a babá ou familiares. Eu me sentia muito mal quando saia para viajar porque até os quatro ou cinco anos ele chorava muito na minha ausência. (46 anos, 27 de voo)
5- Uma empregada que está conosco há 20 anos. Eles já se acostumaram. Já senti muita culpa. (46 anos, 25 de voo)
6- Minha mãe. Por certo, eles preferem que eu esteja em casa. Eis porque decidi deixar os voos internacionais e os outros voos com pernoite. Consegui, junto à nossa Diretoria, permissão para ficar trabalhando na Ponte Aérea em 1979, quando nasceu minha segunda filha (a primeira tinha 3 anos). Fiquei trabalhando até 1986, quando fui convidada para ser instrutora no CTC. Passei, então, a fazer os voos das linhas nacionais, até 1992. Só em 1993 voltei à internacional, tranquila e satisfeita com a escolha que fiz para conciliar as necessidades e interesses das minhas filhas e os meus. (46 anos, 24 de voo)
7- A empregada, meu companheiro e minha mãe me ajudaram e me ajudam na criação da minha filha. (44 anos, 23 de voo)
8- Uma babá e meu marido. Agora, meu filho (aparentemente) reage bem. Ele só tem quatro anos e não posso saber ao certo o que se passa em sua cabeça. (44 anos, 20 de voo)
9- Atualmente meu filho fica só. Fica um pouco triste, mas já se adaptou. Eu fico ansiosa, muitas vezes. (43 anos, 19 de voo)
10- Tenho uma joia preciosa que trabalha em minha casa há 14 anos, por isso posso trabalhar com despreocupação. Se não tivesse encontrado essa pessoa acho que as coisas seriam muito difíceis. Mesmo assim me sinto culpada por não estar sempre  na vida dos filhos. O meu filho mais novo, de 7 anos, é o que mais cobra a minha ausência. (42 anos, 18 de voo)
11- Minha sogra e meu marido. Minha filha, de cinco anos, cobra muito a minha presença. Quando saio para trabalhar, sempre sinto que estou deixando algo por fazer e que alguém terá que fazer por mim. (42 anos, 17 de voo)
12- Meu atual marido e a empregada. Quando voo muito, nem a reação de minha filha nem a minha são boas, pois existe uma carência afetiva muito grande de ambas as partes. (42 anos, 16 de voo)
13 Tenho uma excelente babá e fiquei anos nos voos “bate-volta”. Neste mês (julho/95) é que voltei aos voos internacionais e estou na Rota Frankfurt. Mas estou arrependida, já que passo três noites e dois dias fora de casa. Acho que eu sofro mais do que minha filha, temendo que ela possa não estar bem, que ela esteja sentindo a minha falta. (42 anos, 15 de voo)
14- Sempre mantive uma empregada e uma babá, até os cinco anos de idade de minha filha. Agora tenho uma filha que me ajuda em tudo. (41 anos, 19 de voo)
15- Meu marido. Ele já está acostumado a ficar com o nosso filho. (40 anos, 21 de voo)
16- Meu marido. Tenho uma boa caseira e avós que, de vez em quando, podem dar uma olhada nos meus dois filhos. Acho que sofro mais que eles. Como filhos de aeronautas eles são mais independentes. (40 anos, 19 de voo)
17- Uma empregada e familiares. Meus filhos reagem bem. Eu me sinto dividida entre a vontade de ir e a vontade de ficar em casa.  (40 anos, 17 de voo)
18- Desde que voltei a morar com meus pais, o que é uma grande vantagem em relação às demais, posso voar sossegada. Se meu filho ficar doente, sei que estará bem cuidado, se for algo simples, é claro. Muitas vezes ele não quer que eu viaje, mas ele sabe que é preciso. Quando eu saio, ele fica triste. Em compensação, quando volto ele fica muito contente e é com a chegada da mãe e não da mala da mãe, pois nem sempre trago presentes para ele. O que me dava muito dó era quando eu chegava de voo e ia dormir à tarde e minha mãe contava que ele se deitava na frente da porta do meu quarto esperando eu acordar.  (40 anos, 15 de voo)
19- A babá. Sou desquitada. Quando minhas filhas nasceram eu já era comissária e elas se adaptaram à minha vida. Não aceitam, só se adaptaram. (39 anos, 16 de voo)
20- Minha mãe, felizmente. Considero-me privilegiada, comparando-me  com outras colegas que, muitas vezes, saem para voos de uma semana deixando os filhos com pessoas contratadas há poucos dias. (39 anos, 13 de voo)
21- Minha sogra. Tenho dois filhos. Eles odeiam que eu voe. A mais velha tem problemas, está sendo acompanhada por terapeuta, pois tem desajuste com a família, é muito agressiva e sempre insatisfeita. O mais novo também tem problemas, mas como o seu temperamento é mais dócil, ele somatiza, tem gagueira, alergia crônica de pele, com variadas manifestações. Apresentou vitiligo, que é uma doença puramente emocional, e se encontra também em tratamento. Sinto-me muito mal por ter a certeza de ser a culpada dos problemas das crianças, por termos uma relação tão fragmentada com o ir e vir das viagens. Eles não têm maturidade para assimilar. Por outro lado, é por eles que eu trabalho, para proporcionar a eles uma vida melhor que a minha, pois vim de família muito pobre e tive que me esforçar muito. (38 anos, 17 de voo)
22- Minha mãe. Sou separada. Minha filha não fica muito satisfeita, mas entende. Sinto muitas saudades dela. (38 anos, 16 de voo)
23- Minha mãe e uma empregada. Sou casada e tenho duas filhas. Elas sentem bastante a minha falta. Procuro conversar com elas sobre a profissão, dizer da minha opção, mas acho que o vazio da ausência de uma mãe, não dá para preencher. Sinto-me triste, mas não tem outro jeito. (38 anos, 16 de voo)
24- Meus pais e uma tia. É uma situação complicada e agitada. Tiro essas pessoas da casa delas e fico muito incomodada. Tenho dois filhos e sinto-me invadida na minha maneira de criá-los. (38 anos, 15 de voo)
25- Minhas filhas ficam com a empregada, quando eu saio, ou com o pai (meu marido), que também é tripulante. Elas ficam muito bem. O trabalho que eu faço com elas é de conscientização da minha necessidade de sair. Converso e explico, elas aceitam e eu me sinto melhor. (38 anos, 11 de voo)
26- A babá. Não tenho parentes aqui e meu companheiro também voa. A babá tem sido o meu braço direito. Como ele reage? Hoje, com um pouco mais de naturalidade, mas eu sei que sente meus afastamentos periódicos, apesar de eu sempre ter uma conversa franca e aberta com ele. Mas ele fala que tem muita saudades. Ás vezes, me sinto culpada, em outras, acho que estou certa, mas sempre com o coração apertado e cheio de saudades, esperando “loucamente” retornar para vê-lo e abraçá-lo, sabendo que estou contribuindo para oferecer a ele um futuro melhor. É a  forma que encontro para continuar e dirimir certos problemas emocionais. Espero trilhar o caminho certo.  (38 anos, 9 de voo)  
27- Foram várias pessoas que se ocuparam de minha filha durante minhas viagens.  Empregadas vindas do Sul, pai e mãe que passavam meses alternados no Rio para me dar apoio, quando estava sem empregada e até mesmo meu companheiro dos últimos anos que, muitas vezes, ficou com ela para eu poder viajar. (37 anos, 19 de voo)
28- Minha filha estuda em colégio, em horário integral; quando retorna, meu marido já voltou do trabalho. Ela adora o colégio onde também estuda alemão, faz ginástica olímpica e natação Sinto-me bem e confio na qualidade do estudo do colégio, bem como na parte esportiva. Não tenho empregada, apenas uma faxineira uma vez por semana. (37 anos, 15 de voo)
29- Uma babá. Nos finais de semana meu marido se ocupa da minha filha. Ela é pequena e tenho um grande  sentimento de culpa!  (37 anos, 15 de voo)
30- Tenho empregada e o pai sempre me dá uma força. Nas férias ou feriados, eles passam temporadas com meus pais. Atualmente, estão mais crescidos e acho que reagem bem: fazem-me encomendas e pedem para viajar. Ainda me sinto culpada e acho que nunca vou me livrar disso. Procuro amenizar minha falta comprando quase tudo o que eles querem. (37 anos, 12 de voo)
31- O pai. Meu marido agora já suporta as minhas viagens, mas meu filho de cinco anos ainda sofre muito com minhas ausências, inexplicáveis para ele! Eu também sofro muito, mas foi essa a profissão que escolhi. (37 anos, 12 de voo)
32- Ficam com a empregada, que é meio que supervisionada pela minha sogra que mora ao lado. As crianças reagem bem e não têm nenhum problema psicológico por isso. Talvez, pela presença quase sempre de um dos pais, dos dois, ou dos avós. Sinto-me angustiada nos voos longos, internacionais. (37 anos, 10 de voo)
33- Minha mãe (que trabalha num hospital) ou meu marido (que também é tripulante). Eu faço voos curtos (até dois pernoites). Por enquanto ele reage bem, pois ainda é pequeno, tem um ano e nove meses. Quanto a mim, sempre fico um pouco preocupada, principalmente quando estou fora do país. (37 anos, 8 de voo).
34- Durante o dia minhas filhas ficam com a empregada, à noite ficam com o pai. Elas estão se adaptando, mas sentem muito a minha falta. Fico triste em deixá-las. (36 anos, 15 de voo)
35- Meu marido e babá. Eu me sinto como toda mãe, sabendo que eles gostariam que eu estivesse em casa. Mas também querem que eu voe e traga presentes.  (35 anos, 15 de voo)
36- Fica com a empregada, sob a supervisão da minha mãe. Meu filho ainda está se adaptando a isso, ele tem dois anos. E eu me sinto um pouco cansada, estressada, e, às vezes, culpada, pela pressão dos outros. (35 anos, 8 de voo)
 37- Minha mãe. Tenho três filhos e eles sentem muito a minha falta. (35 anos, 5 de voo)
38- Meus filhos já ficaram muito com minha sogra, porém ela voltou a trabalhar, então dependo de empregada. Fora aqueles probleminhas domésticos, tem dado tudo certo. Agora, o mais importante é poder contar sempre com o meu marido. Quanto à reação dos meus filhos, ela muda conforme vão crescendo. Minhas filhas, que são maiores, às vezes resmungam, mas no geral compreendem e aceitam. O pequeno tem apenas oito meses. Eu me sinto bem, não me sinto culpada por ficar ausente, pois acredito muito na qualidade do tempo que dispenso à minha família e não na quantidade. (34 anos, 10 de voo)
Sou divorciada e minha filha tem 12 anos. Ela não gosta da minha profissão.  Faço o que posso para agradá-la, mas não troco minha realização profissional e pessoal por causa dela.  (34 anos, 5 de voo)
39- Uma pessoa de muita confiança cuida deles. No geral, meus filhos até que aceitam bem. De vez em quando, tem aquela birrinha! Aí eu paro para conversar e tento convencer que é melhor para nós que a mamãe trabalhe. Às vezes, saio de casa um pouco triste, mas acho que faz parte da profissão.  (33 anos, 12 de voo)
40- Minha mãe é quem toma conta. Tenho três filhos e eles sentem muito minha falta. Se durmo fora, eles têm crise de bronquite, ficam sem apetite e abatidos. Chegam a esconder meus documentos e me agarram para eu não sair. Fico abatida e caio em depressão. Na frente deles tento agir de modo positivo e no caminho do trabalho vou aos prantos. Se minha filhinha, que ainda amamento, chora ou quer o peito na hora de sair, eu volto e atendo até que se acalme. Só então eu saio, mesmo que chegue atrasada. (33 anos, 4 de voo)
41- Minha filha tem seis meses e fica com parentes. Eu me sinto uma mãe desnaturada. (32 anos, 8 de voo)
42- Na minha ausência, meu filho de um ano e quatro meses, fica na escola entre 08h00min e 18h30min. Após esse horário, fica com a empregada, até a chegada de meu marido.   Sei que ele necessita muito da minha presença. Reage mal ficando na escola. Já tive  que mudá-lo de escola, por problemas de adaptação. Não posso me sentir feliz, vendo-o chorar e me chamar quando vou levá-lo para a escola! (32 anos, 7 de voo)
43- Pago muito bem a uma cunhada, para cuidar da minha filha que tem quatro anos e se apegou muito a ela. No momento este é o meu maior problema. Minha filha diz que gosta mais da tia e que não sente a menor falta de mim. Confesso estar entrando em depressão, devido a isso. (31 anos, 9 de voo)
44- Minha filha tem oito anos e fica com a empregada.  Ela já está acostumada e eu saio de casa tranquila, sem culpa. (31 anos, 4 de voo)
45- Minha filha já passou pela mão de muitas babás, amigos, mãe, sogra, madrinha e até hoje isso é um grande problema. Nossos filhos se sentem desprotegidos e abandonados e nós temos que fingir que está tudo bem, fechar a porta do nosso lar e rogar a Deus que tudo corra bem. Hoje, eu jamais assumiria esse trabalho e estou lutando para mudar. (30 anos, 10 de voo)
46- Minha mãe. Meu filho quer que eu fique com ele e eu fico péssima tendo que deixá-lo chorando. É duro a mãe ir embora assim de repente. Por mais que ele saiba que é meu trabalho, ele sente e sente muito! Mas ele gosta desse meu estilo “mãe total” quando chego. A gente faz a maior festa e ele realmente me adora. A gente se curte demais quando pode, e, por incrível que pareça, ele me respeita mais até do que os filhos de colegas “de terra”. (30 anos, 6 de voo)
47- Tenho duas empregadas, e minha mãe e minha sogra me dão assistência em caso de problemas de saúde. Minhas filhas já entendem, muito embora não aceitem a situação. E muitas vezes me sinto culpada.  (29 anos, 8 de voo)
48- Mãe, pai, marido, empregada... quem puder! Minha filha estava muito insegura, ela tinha medo de que eu fosse ao banheiro e não voltasse, que eu fugisse. Já me senti pior, mas hoje tento me adaptar dando segurança para ela. Até está melhor, já não chora tanto quando eu saio. (29 anos, 8 de voo)
49- Por enquanto, minha empregada, minha mãe e minha sogra se revezam para cuidar de minha filha. Só que não posso pernoitar fora porque não podem assumir essa responsabilidade. Por isto estou nos voos “bate-volta”.  (29 anos, 5 de voo)

XVIII- Como você se sente antes fazer um voo?  E depois de chegar de um voo?
Das comissárias que responderam essas questões, em torno de 30% se sentiam bem e normal, ao sair para fazer um voo. Algumas, em torno de 10%, se sentiam felizes, animadas. Mas 60% se diziam ansiosas, angustiadas, preocupadas, tristes, sem vontade de sair, mal humoradas, desanimadas, deprimidas, chateadas, nervosas e agitadas.
Ao voltar, a grande maioria se dizia cansada, exausta, péssima, deprimida, tensa, cansada e feliz, extremamente exausta, esgotada, mal humorada, “morta”, aliviada por chegar, cansada, mas feliz por voltar, cansada, mas com a sensação de missão cumprida.

A seguir,  as justificativas das Comissárias que se manifestaram sobre essas questões:
 1- Antes, sinto-me como se fosse fazer o primeiro voo! Quando chego, só saio de casa em último caso.  (54 anos, 33 de voo)
2- Eu encaro as viagens com naturalidade. Procuro adiantar os serviços da casa, para pegar a Rodovia Presidente Dutra e chegar a tempo no aeroporto. Moro longe do Rio de Janeiro, duas horas e meia de carro. É lógico que tenho mais prazer em fazer viagens para determinados lugares do que para outros. Ao chegar, sinto que é sempre muito bom voltar para casa.  (52 anos, 34 de voo)
3- Antes, me preparo como se fosse para uma festa. Na volta, sinto-me humilhada pelo cansaço. (49 anos, 25 de voo)
4- Antes, sinto-me normal. Antigamente, quando meu filho era pequeno, eu ficava muito ansiosa. Ao voltar, estou sempre cansada.  (46 anos, 27 de voo)
5- Ao sair, estou ansiosa, como nos primeiros tempos, mas já com vontade de voltar. Ao chegar, estou sempre cansada, mas com a sensação do dever cumprido. (46 anos, 25 de voo)
6- Muitas vezes me sinto ansiosa, em outras deprimida. Na grande maioria das vezes, chego exausta. (45 anos, 22 de voo)
7- Fico triste quando saio de casa. Quando me apresento no Despacho Operacional, minha atitude passa a ser profissional. Quando entro no avião, gosto de estar lá e do trabalho que vou realizar.  Quando volto, estou cansada, mas feliz.  (42 anos, 16 de voo)
8- Tento fazer tudo o que tenho para fazer já na véspera do voo, para que no dia de ir trabalhar não tenha que fazer muito esforço. Após o voo, sinto-me um lixo. Esgotada, mal humorada, cansada e com fome de comida caseira. Querendo apenas tomar banho e dormir.  (42 anos, 13 de voo)
9- Ao sair, sinto-me feliz. Mas na volta é terrível, sinto-me  exausta. E uma coisa que influencia muito é a tripulação, que pode aumentar ainda mais o meu cansaço. (41 anos, 19 de voo)
10- Geralmente fico tensa em ambas as situações. Sempre chego um pouco irritada pelo cansaço. Quando chego muito tensa e irritada, quero ficar só. ( 41 anos, 15 de voo)
11- Depende do voo. Ao sair, tudo é uma surpresa, em todos os sentidos: colegas, passageiros e situações que vou viver. Ao chegar, às vezes, gostaria que eles tivessem uma duração maior de tão fantásticos, em outras, queria que nunca tivessem acontecido! No final dos voos estou sempre exausta. (40 anos, 18 de voo)
12- Se o voo for desgastante e os colegas ruins, sinto-me arrasada. Caso contrário tenho satisfação. Ao chegar, estou desanimada e fraca. (40 anos, 12 de voo)
13- Ao sair, fico extremamente agitada, pois tenho que deixar tudo organizado para os dias que estarei fora. Ao chegar, estou sempre exausta. (38 anos, 15 de voo)
14- Sempre fico um pouco desanimada, ou porque fiz muita coisa ou porque tenho muito a fazer. Mas depois consigo fazer as malas, me arrumar e ir para o aeroporto. Então me sinto melhor e animada. Quando chego, também me sinto um pouco desanimada por saber que, com certeza, não poderei descansar, porque certas coisas esperam por mim. Toda essa sobrecarga ocorre, não por causa da aviação, mas sim por causa dos homens que não dividem com as esposas as tarefas. As mulheres saem de casa para trabalhar e ajudar os homens na carga financeira, mas eles, por sua vez, não ajudam a mulher com as tarefas domésticas e a educação dos filhos. (38 anos, 11de voo)
15- Antes do voo, sinto que tenho que interromper todo o ritmo de atividades que estou tendo. Perder compromissos com os amigos é o que mais me frustra. Depois do voo me sinto sem energia, desvitalizada mesmo, desmotivada para ingressar no ritmo novamente.  E saber que dali a uns dias terei que interromper tudo novamente, é muito frustrante. (38 anos, 9 de voo)
16- Muitas vezes, fico ansiosa, preocupada. Depende da fase que estou atravessando em casa (no sentido de estar bem assessorada ou não por empregada). Ao chegar, me sinto muito feliz em estar de volta e encontrar tudo bem. Apesar de que o pernoite muitas vezes é a chance de descansar e me desligar dos problemas do dia a dia.  (37 anos, 19 de voo)
17- Ao sair, fico sempre muito irritada. Deixar meus filhos não é fácil. Ao chegar, estou exausta, mas disposta a ouvi-los e estar com eles até à noite.  (37anos, 16 de voo)
18- Ao sair, me sinto ansiosa até chegar ao aeroporto ou ao avião. Ao chegar, me sinto feliz, mas as coisas geralmente não estão como gostaria que estivessem. (37anos, 12 de voo)
19- Ao sair, tenho medo de não voltar. É o medo de deixar meu filho. Antes de ser mãe isso não acontecia. Porém, ao chegar ao avião tudo passa. Ao voltar, estou cansada, mas sempre com a sensação da missão cumprida. (37 anos, 12 de voo)
20- Fico triste em deixar a família. Quando volto, e tenho mais que um dia de folga, fico muito feliz. Do contrário, fico muito tensa e não aproveito bem o tempo. (36 anos, 15 de voo)
21- Ao sair, fico apressada para deixar tudo organizado para a minha ausência. Ao voltar, sinto-me ainda mais cansada por ter que resolver tudo o que ficou acumulado durante a minha ausência. (35 anos, 8 de voo)
22- Fico torcendo para que a tripulação seja legal. Depois, quero aproveitar ao máximo o meu tempo de folga.  (33 anos, 13 de voo)
23- Geralmente me sinto um pouco deprimida por estar saindo de casa, mas depois que chego ao avião tudo passa. Quando estou retornando me sinto feliz. Voltar é ótimo, adoro minha casa, minha família. (33 anos, 10 de voo).
24- Ao sair, fico apreensiva e tensa. Corro o dia todo para deixar tudo pronto para os dias em que estarei fora. Vou voar cansada. Na volta, é a mesma coisa porque, às vezes, tenho somente um dia para ir ao médico, resolver muitas coisas e sair novamente, por mais 3 ou 4 dias. (31 anos, 10 de voo)
25- Antes, me sinto angustiada como se estivesse abandonando meu lar e minha filha.  Quando volto é um alívio e uma alegria. (31anos, 9 de voo)
26- Sinto-me bem. Gosto de trabalhar, pensar que sou independente, que faço o que gosto. É também ótimo chegar de um voo, pensando em encontrar aqueles que amo e, especialmente, se tenho alguns dias de folga, para descansar.  (31 anos, 9 de voo)
27- Dependendo do local de pernoite e do voo propriamente, me sinto animada ou estressada por antecipação - apenas pelo fato de pensar na jornada desumana de trabalho que vou enfrentar. Ao chegar, sinto-me contente, pelo voo, tripulação e pernoite (lugares que visitei, amigos que fiz) ou completamente estressada, irritada, sem motivação para mais nada. (31 anos, 8 de voo) 
28- Antes, dependendo do voo, das escalas e da chave do voo, me sinto exausta. No momento, a escala está muito ruim. Começo a pensar em fazer outra coisa, pois desse jeito, trabalhando como estamos e ganhando o que ganhamos, é muito injusto. Chego extremamente cansada e não consigo fazer quase nada.  (31 anos, 8 de voo).
29- Ao sair, se descansei para fazer o próximo voo e se consegui resolver meus problemas pessoais, fico tranquila; do contrário, fico desanimada. Chego sempre muito cansada, mas gosto de voltar para casa. Fico animada quando o voo está acabando, com a sensação de “missão cumprida”.  (30 anos, 8 de voo)
30- Hoje em dia, já não tenho a mesma disposição para o trabalho, como tinha há alguns anos atrás. Saio de casa com vontade de voltar o mais rápido possível. E na volta do voo, esqueço completamente dos dias em que trabalhei e concentro minhas atenções na minha vida particular. (29 anos, 8 de voo)
31- Ao sair, para voar, me sinto triste, com vontade de ficar em casa. Quando volto, estou esgotada. (28 anos, 8 de voo)
32- Ultimamente não sinto aquele prazer que sentia. A crise interna da empresa, as demissões e outras coisas mais, têm me desestimulado bastante. Voltar para casa tem sido a melhor parte. (27 anos, 8 de voo).
33- Passei por um período difícil, estava deprimida e angustiada, por isso não curtia mais os voos. Já chegava cansada no aeroporto, mas procurava dar muito de mim para que o voo saísse legal. Quando voltava, geralmente cansada, precisava de um dia inteiro para repor as energias e me recuperar de todos os problemas que tinha tido a bordo. (27 anos, 3 de voo)
34- Não há regra, mas atualmente não vejo a hora de voltar para casa. Sair tem sido um peso e muitas vezes ao chegar, fico querendo não voltar a ver o trabalho. Ganhar pouco e ter que aguentar desaforo de passageiro tem sido difícil, porque não se pode contar com a defesa da chefia. (27 anos, 4 de voo)
35- Antes de sair, choro, entro em depressão. Depois, ao voltar, estou cansada, mas aliviada. (27 anos, quatro de voo)
36- Procuro sempre me manter tranquila antes de voar.  Chego um pouco cansada. (26 anos, 5 de voo)
37- Ao sair, sinto-me ansiosa e atarefada, tendo que deixar tudo em ordem: geladeira abastecida, remédios, pagamentos, etc. Não me sinto mais entusiasmada com os voos. Quando volto, chego extremamente cansada, ansiosa para chegar, me trancar num quarto e dormir. (24 anos, 5 de voo)
38- Antes, fico ansiosa para saber quem faz parte da tripulação e como serão os passageiros. Ao voltar, estou “morta”!  (21 anos, um de voo)
39- Antes, fico calma e concentrada para que o meu serviço saia perfeito. Depois do voo, sinto-me realizada por ter voado.  (20 anos, 4 meses de voo)
40- Fico muito feliz por mais um dia de trabalho. (20 anos, 2 meses de voo)
41- Sinto-me tensa antes do voo. Quando chego, só quero dormir. (20 anos, 1 mês de voo)

XIX - O relacionamento com os colegas...
Como é o relacionamento das comissárias de voo com os colegas, a bordo e nos pernoites?
A convivência com os colegas é muito dinâmica e tem um peso muito grande no bem-estar de cada tripulante. Compartilhando os espaços das cabines do avião, no atendimento aos passageiros (geralmente pessoas diferentes e desconhecidas), os comissários dependem muito uns dos outros. O trabalho é de equipe e exige que cada um faça a sua parte. Quando alguém se “encosta” o peso fica maior para os outros colegas. Quando alguém não está familiarizado, ou é novato, também faz diferença no andamento dos trabalhos.
Nem sempre, no meio da correria, a convivência é das melhores, mesmo porque cada um tem seu jeito de ser e fazer as coisas. E esse jeito individual leva um tempo para ser assimilado, porque as tripulações não são fixas e cada um tem que se adaptar rapidamente ao grupo, naquele voo específico. Tem a ida e tem a volta do voo... Se tudo correu bem na ida, a tendência é ter uma volta ainda melhor. O contrário também é verdadeiro! E nada substitui a experiência e a maturidade, dois aspectos muito importantes para a boa convivência em um trabalho de equipe.
Nos pernoites, os tripulantes são mais livres para se enturmar ou não. Cada um tem seu jeito de querer aproveitar aquele tempo especial de relativa liberdade, em outra cidade do seu país ou do estrangeiro. O tempo de pernoite pode ser a oportunidade de lazer, cultura, entretenimento, ou mesmo de recolhimento, dependendo do estado de espírito da cada um. Geralmente, as pessoas se aproximam por afinidade e partilham momentos que podem ser maravilhosos e inesquecíveis! Em outras situações, o pernoite pode ser um tempo de muita solidão...
Em suas respostas, 90% das Comissárias de Voo afirmaram que seus relacionamentos com os colegas era: bom, ótimo, muito bom e excelente (nessa ordem). Apenas 10% das Comissárias responderam usando outros termos: fraterno, respeitoso, amigável, democrático, civilizado, tranquilo e alegre. Eis algumas justificativas:
1- Ótimo! Devido à minha idade (54 anos), tenho facilidade para conviver com os jovens, pois vejo neles meus sobrinhos e filhos. Com os mais velhos, a convivência de tantos anos nos tornam pessoas amigas e não apenas colegas.
2- Democrático e amigável (ao menos é esta a intensão), mas nem sempre se pode proceder assim, pela própria característica do tripulante que, em grupo, é bastante heterogêneo: em idade, formação profissional, conscientização e nível de instrução. 
3- Varia, obviamente, de acordo com cada um. Aproximo-me apenas daqueles com os quais sinto maior afinidade.
4- A bordo, mesmo que não goste de fulano ou sicrano, tento ser profissional, nada mais. Nos pernoites, logicamente, tendo afinidade com um ou outro, sou sociável. Ou então, prefiro ficar só e fazer minhas coisas, sem depender de ninguém.
5- Às vezes, é bom, caloroso! Outras vezes, fico completamente sozinha. Nos voos para a América do Norte, raramente alguém me procura para sair.
6- A bordo, sou profissional. Nos pernoites está muito difícil voar com o grupo conhecido. Às vezes, os pernoites se perdem, pois como as pessoas não se conhecem bem, cada um vai para um lado, ou simplesmente ficam em seus quartos, por medida de economia. É uma pena, pois se está perdendo grande parte deste potencial gostoso, que é passar o tempo do pernoite com os colegas.
7- Muito bom! Sou uma pessoa tranquila, calma, e me relaciono bem com os colegas, mesmo com aqueles mais exaltados.
8- A bordo, é o melhor possível. Brinco, pois não deixo nada influenciar no desempenho de minhas atividades. Nos pernoites eu descanso, leio muito ou saio com algum colega mais chegado. Não gosto de grupos grandes para sair.
9- A bordo, meu relacionamento, em geral, é descontraído. Procuro me aproximar dos colegas com os quais sinto mais afinidade e manter cordialidade com os demais. Procuro cada vez mais me livrar dos preconceitos que possam me impedir de ver as pessoas como elas são. E aí fica mais fácil ter bons relacionamentos! Nos pernoites saio em grupos, mas também saio sozinha. Durante a época de aulas, restrinjo minhas saídas para ter mais tempo para estudar.
10- É muito bom. Raramente fico no quarto do hotel, só se estou muito cansada ou doente
11- Com a maioria dos colegas me relaciono muito bem. Nos pernoites procuro não ficar sozinha, saindo com as pessoas com as quais tenho maior entrosamento.
12- Muito bom! Aprendi a fazer muitas coisas sozinha: almoçar, jantar, passear. Assim não dependo dos outros. Se eu tiver companhia, ótimo! Se não tiver, também está bom. Sempre levo livros e, muitas vezes, trabalhos manuais para o pernoite. Ou escrevo cartas. 
13- É ótimo! E também uma grande parte da minha vida social.
14- É ótimo, divertido, gratificante! Tanto a bordo como nos pernoites. Às vezes, voo com pessoas desajustadas, antipáticas, mas sei que o problema não é meu e sim deles. Então procuro, quando possível, tentar melhorar o relacionamento, mas nem sempre isso ocorre. Aí eu as ignoro.
15- Acho muito bom, pois respeito as pessoas, suas características, seu modo de ver. Nos pernoites, muitas vezes saímos juntos para jantar, bebericar. É bom e divertido! 
16- É ótimo a bordo. No pernoite é preciso uma identificação para que haja convivência.  Atualmente prefiro estar sozinha e ler um bom livro.
17- É muito superficial. Aprendi a lidar com todo tipo de gente. Como ainda sou “novinha”, pertenço à última turma formada, saio geralmente com outras novinhas. E quando não há, aprendi a sair sozinha. Odeio, mas é necessário. É difícil manter o contato com tripulantes.

XX- A escala de voo...
O que é uma boa escala de voo?
Esta é uma das questões mais complicadas na vida de qualquer tripulante, pois a escala de voo é a programação dos destinos e horários de trabalho que devem ser cumpridos de acordo com as determinações da Diretoria de Tráfego Aéreo de cada empresa, sempre levando em consideração as leis que regulamentam a profissão.
Os destinos e horários são muito variados e interferem diretamente no modo de vida dos tripulantes, que, estando à disposição da escala, não têm hora certa para viajar, nem dormir ou se alimentar - pois não seguem o horário do dia civil, como a maioria dos outros trabalhadores. De acordo com as programações, a escala de voo pode ser fonte de prazer ou de sofrimento. Se os voos são mais ou menos cansativos, se têm pernoites, se os destinos são interessantes... Se o voo está programado no final de semana, no feriado, no dia de aniversário de alguém importante na família... Mas, acima de tudo, a escala vai determinar o tempo que o tripulante deverá estar à disposição da empresa e o que restará para viver e administrar sua própria vida...
Na Varig, a escala de voo, geralmente, era mensal, o que permitia uma boa perspectiva do tempo que cada tripulante teria de trabalho e de folga e assim podia se organizar na vida particular e social, além da profissional.
Na Vasp e Rio-Sul, a escala de voo era semanal. Os tripulantes dessas empresas eram, muitas vezes, obrigados a ir buscar a escala de voo, que começaria a valer já no dia seguinte, no seu dia de folga! No tempo em que essa pesquisa foi feita, não havia a facilidade que a internet oferece. O uso do telefone para se comunicar com a escala de voo era uma constante, tanto para confirmar os horários das apresentações no aeroporto, que poderiam sofrer alterações de última hora, como para receber novas programações, caso o tripulante estivesse de Reserva ou Sobreaviso – condições em que ficava à disposição da empresa por tempo determinado, no aeroporto ou em casa.
Estar sempre viajando é a principal característica da profissão da Comissária de Voo. Estar sempre viajando é a sua condição e seu estilo de vida. No início, tudo parece tão maravilhoso! As jovens que são atraídas para essa profissão não imaginam que com o passar do tempo e com os compromissos que vão assumindo na vida, como uma relação de casamento, ou um curso universitário, por exemplo, os conflitos de interesses possam surgir e se acentuar. A conciliação da vida profissional com a vida particular vai se tornando ainda mais difícil, quando as comissárias tornam-se mães. Ficar ou não ficar na profissão é uma decisão individual, com custos e benefícios.
A Lei que regulamenta a profissão determinava que as folgas no mês fossem de, no mínimo, oito dias. A partir do final dos anos 80, com a expansão da aviação e do sistema de transportes aéreos, o mínimo passou a ser a regra em algumas empresas. Administrar e conciliar as necessidades da vida profissional com as da vida particular tornou-se extremamente difícil. Como é viver a vida particular com oito folgas no mês, tendo as 24 horas dos outros 22 ou 23 dias à disposição da empresa? Qual é a profissão que exige todo este tempo de um trabalhador nos dias de hoje? Os próprios tripulantes vivem tão envolvidos com as viagens e com o desgaste dos voos, que não se dão conta de que a escala, tirana e desumana, é decorrência de uma regulamentação ultrapassada...
Os tripulantes estão muito tempo à disposição das empresas  (nos despachos operacionais dos aeroportos, nas salas de espera para o embarque, no avião recepcionando os passageiros ou atendendo-os antes da decolagem, durante os voos, nas escalas dos voos e também nos atrasos dos voos), mas só recebem pagamento pelas horas voadas  – quando o avião está no ar! Isso explica o abuso no  uso do tempo dos tripulantes. Se as empresas tivessem que pagar pelo tempo que elas realmente dispõem desses profissionais, teriam que pagar uma pequena fortuna, ou, então, abusariam muito menos!
Nas programações das escalas de voo, para ficar bem evidenciado o tempo total que os tripulantes estão à disposição da empresa, além dos voos (mesmo que tenham uma carga horária que chegue ao limite máximo permitido pela legislação), têm também as Reservas (geralmente nos aeroportos), os Sobreavisos (em casa), e ainda o “NP”, que significa “nada programado”. As reservas, sobreavisos e NPs servem para facilitar as mudanças de última hora, quase nunca esclarecidas, em prejuízo da programação de voo publicada que permite ao tripulante organizar e administrar sua vida e interesses particulares. Servem também para dividir as folgas e diminuir o tempo de descanso e lazer do tripulante.
Explicações à parte, eis as respostas das Comissárias, que, na sua maioria, querem apenas uma escala humana e justa. Uma escala que permita o devido descanso após os voos, tempo de convívio com a família e com os amigos. As respostas são muito parecidas. Selecionamos algumas que expressam o pensamento comum:
1- Uma boa escala é uma escala justa, com os voos bons e ruins sendo feitos por todos e com, no mínimo, três dias de folga entre eles. Que permita a conciliação de vida pessoal com a profissional.
2- Uma boa escala é aquela que tem voos diretos, de preferência, sem plantão, sobreaviso ou reserva. E me proporciona descanso necessário para sentir-me bem e com vontade de cumprir toda a programação mensal.
3- É aquela que tem dois ou três dias de folga entre uma viagem e outra. O que acontece é que muitas vezes os voos bons vão para aqueles que têm amizade com os escaladores, sobrando os voos considerados ruins para os outros comissários.
4- É aquela que respeita o ser humano como ser humano. Que proporciona condições adequadas para o descanso entre as programações e permite que se tenha tempo para a vida particular.
5- É aquela que permite termos uma vida profissional produtiva e também uma vida familiar e social. Com rodízio de voos e folgas. Que nos permite sentir e saber que somos gente também, com direitos sociais iguais aos demais profissionais.
6- É aquela que tem rodízio de voos e folgas de 24 horas, de acordo com o dia civil: de 00h00min às 24h00min h. E não folgas que começam em um dia e terminam no outro. Sei que, por lei, nós temos direito a períodos de folga, mas não custa nada ou custa muito pouco a escala observar esse item.
7- É uma escala humana, que se preocupa com o repouso do tripulante e com um número de folgas que permita ao tripulante ter convívio familiar. Esses tais voos da “missa” com duas noites sem dormir e apenas 12 horas de descanso, que são sempre menos de 12 horas no final, são desumanos!
8- É aquela que tem equilíbrio e ponderação, não exploração! Dentro da regulamentação podemos passar duas madrugadas seguidas trabalhando... Como ser feliz, sem folga no fim de semana? É uma eterna guerra com a escala. Alguma coisa precisa mudar!
9- É aquela que realmente cumpre o rodízio dos voos, com folgas diretas, sem reservas e sobreavisos no meio. Sem “minissérie” abusiva, tipo “voos conjugados” para Porto Alegre, Buenos Aires, Brasília, por exemplo.
10- É aquela que faz rodízio de voos, que tem um bom período para o descanso e também tem folgas no meio da semana, para pagamento de contas, fazer compras no supermercado etc.
11- É aquela que tem uma programação de voos bem distribuída, sem reservas entre as nossas folgas. Se a escala fosse mais bem organizada metade dos nossos problemas desapareceriam.
12- É aquela que não tem “minissérie” de reservas e sobreavisos; que tem bastante horas de voo e folgas suficientes para o nosso descanso entre um voo e outro. Funcionário estressado não produz. Uma melhor remuneração também faria com que muitas pessoas não se desgastassem ainda mais arrumando “bicos” para melhorar seu poder aquisitivo.
13- A escala deveria ser mensal, bem distribuída e justa (bons e maus voos para todos), que não mudasse frequentemente e nos atendesse nos pedidos de folga.
14- É aquela que nos permite uma vida produtiva e digna, com tempo equilibrado para o trabalho, o descanso e também para nossa vida particular e social.
 ***


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentário é bem vindo!