terça-feira, 17 de junho de 2014

Susy

Susy*

Nasci em 1942, no interior do Rio Grande do Sul. Minha família é bem numerosa: somos 10 irmãos, seis mulheres e quatro homens, sendo que uma irmã é adotiva. Até a minha adolescência, fui criada na cidade de Rio Grande; depois morei em Porto Alegre. Por parte de pai, sou descendente de ingleses. Por parte de mãe, sou descendente de portugueses. Tive uma infância muito boa no interior. Os meus avós tinham uma chácara e lembro bem da época de férias que passávamos com eles, onde tudo era muito saudável. Hoje em dia, as pessoas estão voltando a valorizar a vida simples do interior.
Meu pai trabalhava no porto de Rio Grande e sempre foi um lutador porque tinha uma grande família para sustentar. Lutou muito para que os filhos pudessem estudar. Depois, eu, como irmã mais velha, via Varig, é que continuei ajudando meus irmãos e consegui fazer com que a maioria deles se formasse.
Minha mãe, apesar de não ter tido formação, era uma mulher de muita visão. Ela se sacrificava muito para que pudéssemos estudar. Também trabalhava e não admitia que os filhos parassem de estudar, nem mesmo para trabalhar. Então, nós só começamos a trabalhar depois de completar o segundo grau. No Sul, isso era um luxo naquela época. Depois do primeiro grau os jovens já iam à luta. Mas ela achava que a gente tinha que estudar e arranjar um bom trabalho. Também achava que o casamento era secundário.
Em linhas gerais, eu lembro que naquela época, lá no Sul, quem estudava tinha perspectivas na vida. A minha família foi privilegiada nesse sentido, na década de 60 e 70. Hoje em dia, o que vejo é um clima totalmente sem perspectiva para o pessoal jovem, mesmo nos grandes centros. As pessoas fazem faculdade e nada conseguem; precisam fazer pós-graduação e mesmo assim são poucos os que encontram chance no mercado e isso é preocupante.
Comecei a trabalhar com 17 anos em um Banco e fiquei lá durante dois anos e pouco. Naquela época eram 6 horas de trabalho por dia e eu estudava e trabalhava. Depois de terminar o curso normal, também trabalhei como professora no Serviço Social de Menores.

Emprego na Varig, mudanças na família
Entrei para a aviação porque uma amiga estava se candidatando e me incentivou a fazer parte da primeira turma de aeromoças da Varig que ia para a base do Rio de Janeiro. Eu ainda trabalhava no Banco e nem tinha ideia de como seria a profissão, quando surgiu essa oportunidade de trabalhar na Varig. Mas a questão do salário foi tentadora, pois eu iria ganhar bem mais do que ganhava naquela época.  E havia também a questão do desafio.
Eu estava com 22 anos, cursava o segundo ano de psicologia na PUC. Tranquei a matrícula e vim para a Varig. Quando viajamos para o Rio de Janeiro, eu não tinha ideia nem expectativa em relação ao meu trabalho. Para mim era uma oportunidade de vir para um grande centro e ter mais oportunidades de crescimento. Naquela época foi uma boa opção profissional. Eu ganhava bem e contribuía com praticamente a metade do orçamento familiar. Meu pai pagava o estudo para os meus irmãos, mas as roupas e outras despesas eram por minha conta.
Vim para o Rio de Janeiro em 1964. Vim e fui trazendo muitos dos meus irmãos, que hoje estão muito bem encaminhados. Tenho uma irmã que é professora na Universidade Santa Úrsula, outra que trabalha na IBM e um irmão que é gerente de Banco. Se tivéssemos ficado no Sul, na época, a perspectiva seria mais limitada e não sei se teríamos tido esse desenvolvimento. Então, eu acho que houve uma ascensão social e profissional em nossa família.
Também trouxe meus pais para morar no Rio de Janeiro. Meu pai faleceu há três anos e a luta continua porque há as outras gerações, há os sobrinhos que precisam se formar... Estou criando uma sobrinha porque os pais dela faleceram. Então, o que eu sinto muito forte na minha vida são esses valores familiares, essa vontade de investir na família e no futuro. Eram as nossas premissas lá no Sul e continuam sendo ainda hoje.
Curso de Comissários
Durante o cursinho, no Rio de Janeiro, nós ficamos num alojamento de um andar inteiro alugado pela Varig. Morei num dos apartamentos à beira mar, com mais três colegas de voo, todas oriundas do Sul e isso me marcou bastante. Na minha turma, além das gaúchas, tinha uma francesa e três orientais, vindas do Japão. A Taeko, que se aposentou no ano passado, mal falava o português. Nós gostávamos muito dela e a ajudávamos. Tínhamos uma coordenadora chamada Cecília, que era argentina. Era a “Dona Alice” daquela época. Ela não ficou muito tempo na Varig, mas era a Coordenadora Geral do Curso de Comissários, em 1964. O curso, com duração de três meses, foi muito bom. Muitos anos depois, quando a Varig optou pela terceirização do curso, vim trabalhar no Centro de Treinamento de Comissários. As matérias básicas são quase as mesmas, mas a duração do curso diminuiu.

Primeiros voos, pernoites
Começamos voando nas linhas nacionais. Trabalhei no Avro, no Electra, no DC–6 e depois no B–707, que era o máximo naquela época! Quando começou o Voo da Amizade, nós íamos para Lisboa de Electra. E isso era um grande acontecimento. A gente pousava em Recife, depois na Ilha do Sol, no Atlântico, para reabaster o avião, e depois chegávamos em Lisboa. Dava umas 12 horas de voo. Naquela época, tínhamos muitos dias de pernoite porque não havia muitos voos. Não é como agora, com esses voos bate-volta, que não dão oportunidade aos comissários de conhecerem os lugares.
Hoje em dia, os tripulantes dizem que estão fazendo viagens internacionais, mas isso é fantasioso porque, na verdade, eles conhecem o hotel e as imediações. Não conseguem aproveitar a vida cultural do país onde pernoitam. Na minha época o privilégio era pernoitar muitos dias em cada lugar. Tinha um voo para a Itália com quase uma semana de pernoite. Podíamos viajar, fazer excursões e realmente conhecer os lugares. Mesmo sem ter estudado italiano, nos comunicávamos no idioma pelo fato de termos essa convivência maior com as pessoas daquele país.  Hoje em dia, isso não é mais possível.

Opções, desafios
Trabalhei na Varig de 1964 até 1972 e pedi demissão porque comecei a me sentir estagnada e sem um desafio intelectual maior. Com as viagens, tinha conhecido o suficiente e achava que não estava mais agregando valor à minha vida. Era muito benquista no grupo de voo e sempre fiz meu trabalho com muito carinho, mas estudar era uma demanda pessoal, uma necessidade de crescimento. Cursei Psicologia e, naquela época, a Universidade tinha uma carga horária muito rígida; hoje em dia o estudo é mais facilitado. Nós tínhamos que fazer todas as matérias teóricas de manhã, e estar lá, para os laboratórios, à tarde.
Deixar a aviação não foi fácil, mas fiz a minha opção. Meus colegas sabiam que eu ia ganhar bem menos e me perguntavam: “Você vai largar as mordomias da aviação”? Eu respondia que as coisas não tinham tanto peso assim e que a gente vai mudando e se acostumando.
Eu morava na Lagoa Rodrigo de Freitas num apartamento de três quartos e mudei para o Leme, em um apartamento de quarto e sala. Nessa época já morava com três irmãos. O nosso padrão baixou mesmo, mas não me importei. Aliás, tenho até bastante saudade daquela época de dureza, porque tínhamos muita força. Meus irmãos já trabalhavam, mas estavam em início de carreira e ganhavam pouco. Aos poucos, todos eles foram crescendo e fizeram belíssimas carreiras.
Eu sou uma pessoa que me atiro de cabeça naquilo que faço. O estudo me alimentava muito e por isso eu não me importava de não ter mais perfume francês, nem bolsa de marca italiana. A gente vai amadurecendo e os nossos valores também. Vindo de uma classe pobre, essas coisas eram desejadas no início, mas depois perderam o peso. Senti muita saudade dos pernoites, dos ambientes que frequentava, porque vivi uma boa época na aviação e naquele tempo a tripulação era muito unida. Nisso há uma perda porque quando você sai da aviação você fica com poucas amizades, ou seja, fica com aquelas que são verdadeiras. 
Fazendo um balanço, vejo que era coisa da juventude, que era bom socialmente, mas não era perene. As pessoas se aproximavam até por necessidade de estarem juntas para se fortalecerem. O grupo se unia e fazia as programações junto. Hoje em dia, isso quase não acontece porque as pessoas têm pouco tempo de pernoite, ganham menos e procuram gastar o mínimo possível. Então, não investem mais na relação social como se fazia naquela época, quando havia um clima muito bom entre os tripulantes e tempos longos de pernoite.

Retorno aos estudos
O retorno à universidade foi altamente realizador. Achei que estava defasada porque estava sem estudar havia alguns anos, mas, ao contrário, estava atualizadíssima e mais madura. A minha turma era composta de gente muito jovem que não tinha essa vivência. Para eles, estudar era obrigação e para mim era prazer e investimento. Tanto que, em seguida, fui monitora, consegui estágio, coisas que não se conseguia com facilidade. Os mais jovens estavam ali porque passaram no vestibular, mas não tinham ainda tanta convicção do exercício profissional.
Retorno à Varig
Quando saí do voo, o diretor, na época o senhor Sérgio Prates, me falou que as portas estariam sempre abertas para mim. Eu havia explicado a ele o motivo pelo qual estava saindo e ele tinha essa visão de futuro, sabia valorizar as pessoas que tinham potenciais e que mais tarde podiam voltar e agregar valores para a empresa.
Depois de formada, vi que não queria clinicar porque existem todas as variáveis sociais. A gente faz um trabalho de recuperação muito difícil, com população carente, num ambiente de hospital e, quando as pessoas têm alta, voltam para o meio ambiente e retornam para o hospital com os mesmos problemas. Tudo isso é muito frustrante! Então pensei em entrar para a área de Psicologia Organizacional. Fiz um projeto e fui mostrar para o Sérgio Prates, na Varig. Ele gostou e me recomendou para a área de Recursos Humanos.
Foi um retorno excepcional. Essa oportunidade de retornar à empresa não existe mais, a não ser quando você sai, num quadro de controle de despesas, e depois a empresa honra a readmissão. Mas, normalmente, as pessoas que pedem demissão não têm chance de retornar. Eu tive, também, essa chance na Varig.
Em termos profissionais, para mim foi um ganho o fato de entrar para a área de Recursos Humanos, onde trabalhei de 1981 até 1992. Entrei realizando as tarefas básicas, como psicóloga, fazendo acompanhamento, participando da seleção. Mas depois fui para a área de acompanhamento psicológico onde a demanda com tripulantes era maior. Os casos de funcionários de terra eram poucos, apenas alguns relacionados com a reabilitação profissional depois de um acidente de trabalho.
Também foi um ganho ter sido convidada, na gestão passada, pela Diretoria do Serviço de Bordo, para assumir, como gerente, o Centro de Treinamento de Comissários, onde fiquei por mais de dois anos. Fui para lá com muita expectativa, mas não deu para realizar o trabalho que planejei por causa de toda essa mudança na empresa. A minha expectativa era mudar o treinamento técnico-operacional, acrescentando novos enfoques. Mesmo assim foi uma experiência de muito crescimento.

Nova geração de Comissários
Ao retornar para a aviação, o que mais me chamou a atenção foi encontrar outra geração de comissários, outro perfil de profissional. A Varig estava em fase de expansão, admitindo com facilidade, sem o rigor de antigamente. Na minha época, na década de 60, o grupo era bem menor, mais reservado, mais reprimido, mais enquadrado e as pessoas procuravam se adaptar às exigências da empresa. Havia muita cobrança em relação à apresentação, educação e disciplina. Nas décadas seguintes, esse grupo já era muito diferente.
A empresa estava crescendo de forma extraordinária, os novos jatos chegando e não havia tempo para procurar no mercado o perfil ideal para o exercício da profissão. Eram contratados, aproximadamente, 400 novos comissários por ano e os cursinhos eram dados pela própria empresa. Agora, havia necessidade de contratar pessoas que falassem outros idiomas.
Quando eu entrei para a aviação, o importante era saber o básico, para se comunicar com os passageiros. Havia poucas linhas internacionais, mas a partir de 1975 esse quadro mudou drasticamente e o idioma começou a ter muito peso na escolha dos candidatos. E o que aconteceu? Foram admitidas pessoas que não atendiam todos os requisitos que a profissão exigia, ou seja, aquilo que se espera de uma pessoa que atende ao público.
Ao mesmo tempo, o mercado de trabalho foi se estreitando e o pessoal de nível superior se viu sem alternativa. Hoje, a maioria dos comissários tem nível superior e no fundo são muito frustrados porque não conseguiram se realizar naquilo que estudaram. Aqueles que entraram com uma expectativa, e depois perceberam que não se identificavam com o trabalho, acabaram ficando por necessidade e também por ser uma profissão charmosa, que proporciona uma boa bagagem cultural. Mas esses ganhos não são essenciais e as pessoas começam a atuar de forma mecânica, sem amor ao que estão fazendo. Não têm mais aquela naturalidade para abordar o passageiro, conversar, dar atenção. Fazem o mínimo e automaticamente.
Antes, havia uma formalidade, pois não se podia tomar intimidade com o passageiro, mas hoje o que existe é um distanciamento. O cliente não se sente bem recebido e tem a impressão de que está sendo atendido de favor. Esse é o meu sentimento e eu sinto muita pena! Sei que não posso generalizar, pois não são todos assim. Ainda existem, em número bem menor, os verdadeiros profissionais.
 Então, o que houve foi uma falha estrutural da empresa que não soube fazer uma seleção adequada nem um bom acompanhamento do profissional contratado. A imagem da empresa começou a ficar desgastada com a queda na qualidade dos serviços prestados. Houve um somatório de razões. E aqui estamos tratando dessa parte que diz respeito à profissão do comissário de voo que tem como missão atender bem o passageiro, cliente da empresa. Para se recuperar, a empresa precisaria fazer um esforço gigantesco. Ganhar espaço no mercado é uma coisa, conservar e manter esse espaço exige um esforço dobrado.

Resgate do profissionalismo
Para resgatar o profissionalismo acho que seria necessário fazer um trabalho intenso, que até pretendi fazer no Centro de Treinamento de Comissários. Mas isso depende de investimento financeiro maciço e “santo de casa não faz milagre”. É necessário chamar uma consultoria especializada, respeitada, para trabalhar com a população de comissários, investir na área comportamental, na área da consciência do indivíduo para que ele possa buscar a realização em termos profissionais e pessoais. Se o trabalho for feito por profissionais da própria empresa, os comissários vão achar que apenas uma questão patronal. Então, uma consultoria poderia fazer a intermediação, mas estamos vivendo numa época de crise...
Não é nada fácil trabalhar com o grupo de comissários, pois a prioridade deles é o voo. Então, se faz necessário um intenso planejamento para deslocá-los da escala de voo, do mais novinho até o mais antigo. São 3.300 comissários e todos deveriam passar pelo mesmo tipo de treinamento e conscientização. Isso seria o ideal, mas estrategicamente é difícil, pois representa um grande investimento para a empresa e exige muito tempo.
Então, temos que começar pelas lideranças que são os Chefes de Equipe e os Supervisores de Cabine. Eles precisam assumir o gerenciamento e não apenas o papel operacional. É um desafio muito grande, uma questão de custo/benefício, mas acredito que a empresa esteja mais atenta e que a nova presidência e a nova diretoria farão mais cobranças nesse sentido. Acho que é o que a Diretoria de Operações irá fazer, agora que está responsável pela gestão de todos os tripulantes.

Insatisfação profissional
Aplicamos a pesquisa de clima em toda a Organização Varig e ela foi tabulada em termos do que cada grande categoria dentro da empresa tem. O nível de insatisfação maior em relação à empresa estava entre os tripulantes, no grupo dos Comissários de Voo. Era uma insatisfação muito localizada no pessoal que estava entre 8 e 14 anos de casa. Isso ficou claramente constatado na pesquisa.
O pessoal mais novo estava em fase de motivação, porque tinha a perspectiva de entrar para a escala dos voos internacionais. Isso é estimulante em termos de carreira. Mas, o pessoal do meio, que representava uma grande faixa de funcionários, estava altamente desmotivado em relação à profissão e em relação à empresa. Acho que essa população deveria ser trabalhada com prioridade por parte da Diretoria de Operações.
Antigamente, pelo estereótipo da profissão, acho que a imagem dos comissários correspondia quase que totalmente. Não tanto em nível cultural, mas no geral, em termos de aparência, de apresentação, nos requisitos básicos. Hoje em dia, existe uma distorção do perfil. Nós temos profissionais mais velhos, em termos de idade, que têm muita experiência, muita bagagem profissional. E temos os mais novos, que não têm essa experiência, mas em compensação também não têm o stress causado pelo tempo e pelo exercício profissional.
São os mais novos que mais combinam com o perfil profissional. O problema é que a empresa não tem uma estratégia para remanejar as pessoas mais velhas ou fazer um contrato de trabalho de menor duração com os mais jovens. O ideal seria que todos se preparassem para a eventualidade de ter que concorrer novamente no mercado de trabalho, quando já não correspondessem ao perfil que a profissão exige, ou para não ter que esperar a aposentadoria numa profissão tão desgastante. 

Contratos de trabalho temporários
Em outros países de grande porte, em empresas europeias e até orientais, os contratos de trabalho são temporários. Adotar essa estratégia aqui no Brasil daria um grande trabalho, do ponto de vista social e sindical. Mas, ao mesmo tempo, é preciso ter a ótica da empresa que precisa revitalizar seus funcionários para continuar operando no mercado. A empresa precisa tomar decisões sérias, apesar da questão humana e social. A aposentadoria deveria ser o somatório de várias atividades; essa é a concepção mais moderna no mercado do trabalho.
Na minha visão de futuro, vejo que esses contratos de longo prazo não existirão mais. Atualmente, a empresa tem as linhas nacionais e internacionais. Mas, por contingência, as pessoas estão ficando muitos anos nas linhas nacionais. Assim, elas não têm o devido desembaraço e a experiência das linhas internacionais. E quando passam para as linhas internacionais já estão com muitos anos de voo. Aí a novidade acabou e o que resta é o stress da profissão propriamente dito.
Pensando como psicóloga, e com a experiência que tenho aqui na empresa, mais de 15 anos na profissão, é muita sobrecarga em todos os sentidos. Com esse tempo, cada profissional teria a oportunidade de resgatar outra atividade no mercado do trabalho.
Também não concordo com o padrão da empresa de admitir jovens com 18 anos. Acho que as gerações de agora amadurecem mais tarde. No meu tempo, aos 18 anos, a gente trabalhava e estudava. Éramos mais maduros. Hoje em dia, como esses jovens vêm de classe média alta, que é a que pode pagar estudos de idiomas para os filhos, eles vêm muito imaturos. É difícil, numa seleção, conseguir um profissional que reúna todos os pré-requisitos. A empresa admite dos 18 aos 30 anos. Eu acho que deveria ser dos 21 aos 30 anos. Se a pessoa voar 10 anos, iniciando com 30, até os 40 anos ela ainda tem chance de se programar. E tem também a questão da apresentação pessoal e da saúde.
Hoje, nós temos um grupo de 1500 mulheres comissárias. Ninguém imaginava todas essas mudanças que estão ocorrendo na sociedade. Ninguém imaginava a mudança do perfil profissional, ninguém estava preparado para isso. É por isso que, do ponto de vista de Recursos Humanos, vai ser um problema sério se a empresa tiver que reformular suas estratégias. Muitos funcionários, principalmente os aeronautas, serão sacrificados. Mais ainda no caso das mulheres comissárias, porque delas se espera uma boa aparência. Se o homem está com 10 quilos a mais a sociedade releva, o mesmo já não acontece com a mulher. 

A questão da mulher comissária
Quando comecei a trabalhar na área de recursos humanos, percebi que os problemas em relação à população de comissárias eram imensos. Até porque fiquei atendendo, fazendo aconselhamento e acompanhamento de retorno de licença psiquiátrica e maternidade. Na minha época, as comissárias quase não casavam ou não tinham filhos. Não tinha uma diretriz oficial, mas havia uma recomendação: “Olha, você com filhos não vai se adequar à profissão”. Então as mulheres já sabiam qual era a regra do jogo e a respeitavam.
A mulher, do ponto de vista emocional, é um ser ambivalente. Ela dá um peso à profissão e um peso à vida em família, principalmente na relação mãe e filho. E isso, realmente, desencadeia um grande stress, muita tensão e um enorme sentimento de culpa. São poucas as mulheres que têm estrutura e conseguem administrar esse stress. Na maioria dos casos, esse conflito na relação afetiva acaba abalando a estrutura do próprio casamento. Geralmente o casamento falha. O companheiro não aguenta essa instabilidade emocional da mulher. E quando ele não é aeronauta, não entende a sobrecarga de ser parceiro e ter que dar suporte, pois entende que a prioridade da mulher deve ser a família.
Na minha época de comissária, as mulheres também não chegavam a ocupar o cargo de supervisão ou de chefia da equipe. Enfim, estamos num outro tempo e as mudanças que estão ocorrendo na sociedade também ocorrem no voo. Vieram mulheres mais preparadas do ponto de vista da formação. Mulheres que também começaram a ficar sobrecarregadas porque casaram; continuaram exercendo a profissão e ainda assumiram a maternidade. Ou então desfizeram casamentos e tentaram manter, sozinhas, o orçamento familiar, pois nem sempre recebiam ajuda do companheiro.
Então, eu vi as moças da turma de 80 para cá, muito sacrificadas mesmo. Acho que nessa profissão é muito difícil conciliar as duas coisas. A mulher se afasta de casa e fica com um grande sentimento de culpa por deixar o filho sozinho ou aos cuidados de terceiros. Ela vem do interior e seus pais estão distantes. Deixa seus filhos na mão de uma babá ou na mão de uma pessoa estranha. Então há um acúmulo de tensão nas mães que viajam hoje. Tanto que se pode ver, na população feminina de 40 anos, que são todas precocemente envelhecidas, com raras exceções. Apesar de conseguirem condições financeiras melhores, elas têm um desgaste muito grande.
Na minha época, as mulheres eram mais relaxadas, menos tensas, com menos sobrecarga. Não eram tão cobradas. Hoje em dia eu até questiono se, nessa profissão, é realmente válido o contrato de trabalho em longo prazo, onde as mulheres têm que trabalhar até se aposentar aos 55 anos. Elas têm que lidar com o público, em situações estressantes, sem condições de manter a saúde e o perfil que a profissão requer. Na verdade tinha que ter uma política de análise da profissão. Se fosse uma profissão de 15 anos ou um contrato que se renovasse de cinco em cinco anos, como algumas empresas estão fazendo, a mulher sairia da aviação com uma grande bagagem e ainda jovem para o mercado de trabalho. Ela não se acomodaria, porque a maioria que entra para a aviação não continua estudando. Consequentemente, fica despreparada para voltar ao mercado. Não tem mais condições, nem aparência, nem saúde.
Se a mulher saísse da aviação com 35 anos, ela teria condições de um novo emprego porque tem a bagagem da vivência das viagens, que é importante. Tem mais desembaraço, mais cultura. Se o contrato de trabalho fosse de 10 ou no máximo 15 anos, ela iria refletir: “Se vou voltar para o mercado de trabalho, preciso me preparar”. Hoje em dia os conceitos mudaram. Não é mais a estabilidade e sim a empregabilidade. Todos os profissionais devem estar preparados. A formação de Comissária de Voo não prepara a mulher para o mercado de trabalho, pois não adianta ter boa aparência ou falar outro idioma. A empresa devia fazer esse alerta, pois sempre existe a possibilidade de redução do quadro de funcionários.

Os afastamentos do voo
Era costume o CEMAL (centro médico da aeronáutica) dar alta para os tripulantes que se afastavam do voo por problemas de saúde e os encaminhar para o serviço médico da Varig. O serviço médico achava por bem fazer uma avaliação psicológica para ver a possibilidade de reintegração da pessoa. Nós fazíamos algumas recomendações para a Diretoria do Serviço de Bordo, se era bom a pessoa voltar aos poucos, trabalhar nos voos curtos (bate-volta), ou se estava apta a voltar ao trabalho nas linhas normais.
O que eu fazia era uma avaliação. Conversava com a pessoa, com toda a atenção e dava um parecer. Poucos foram os casos em que dei um parecer contrário. A maioria, quando se licenciava, procurava um tratamento. Mesmo porque há a recomendação, tanto do CEMAL como da Varig. Poucas não voltaram para o voo. Reincidências de afastamentos por psiquiatria também foram poucas. Poucos foram os casos crônicos, irrecuperáveis para a profissão. Em certos casos, a atividade profissional acelerava o estado de fragilidade da pessoa que numa outra profissão, mais estável, não teria o desencadeamento desse estado de fraquezas.  
Novo perfil do Comissário
Acredito que o novo perfil do Comissário de Voo vai passar, além da apresentação e da educação, pelo domínio de idiomas e pela flexibilidade na área comportamental. São pessoas com cultura e desembaraço, habilitadas para lidar com situações de conflito, passageiros nervosos e coisas desse tipo. Pessoas com mais jogo de cintura, que possam atuar com desenvoltura nas mais variadas situações e representem bem a empresa. Não pode ser uma pessoa muito certinha, muito quadradinha ou muito tímida, incapaz de lidar com grandes grupos de pessoas. Enfim, os candidatos vêm com um potencial e cabe à empresa desenvolver essas habilidades e acompanhar a sua vida profissional.
Nos exames de seleção dá para captar a potencialidade do candidato, mas depois de contratado, a responsabilidade é da empresa, de acompanhar o ajustamento do profissional e também de lhe dar suporte. Outra estratégia que acho que ajudaria muito é a questão das escalas de voo com tripulação fixa, que poderiam ser elaboradas para três ou quatro meses. Esse tempo permitiria uma maior produtividade e mais apoio entre os integrantes da equipe. É um tempo que não chega a saturar as relações no grupo ou provocar incompatibilidades entre os membros. Dessa maneira também ficaria mais fácil fazer o acompanhamento e gerenciamento dos funcionários. No meu entendimento essas escalas temporárias seriam muito mais saudáveis.
Outro aspecto, relacionado com o novo perfil do Comissário de Voo, é o do contrato de trabalho. É provável que a empresa tenha que fazer, no futuro, contratos temporários, de médio prazo. Esse é o meu ponto de vista pessoal, mas é também uma tendência no mundo da aviação. Embora isso não aconteça nas empresas aéreas norte-americanas, onde a gente encontra senhoras de cabelinho branco, que são umas “gracinhas”, atendendo os passageiros. Isso reflete a cultura daquele país que é diferenciada e que se constata no atendimento ao público em geral. Na nossa cultura, priorizamos a juventude.
A população mais jovem não apresenta problemas no desempenho da profissão. Não temos queixas formais do cliente em relação aos profissionais jovens. Mas isso não acontece só em relação aos tripulantes comissários. É em qualquer linha de frente de atendimento na empresa. Dentro da área de aeroportos, na área de reservas e informações, e entre os agentes de lojas, a empresa está percebendo que tem que mudar esse perfil. E nesse sentido vai ter que efetuar mudanças. Eu sinto que esse vai ser o caminho de adequação desses profissionais no mercado.
Problemas, recessão
Os problemas que a empresa enfrenta hoje foi ela mesma que os criou. Não existe uma solução mágica. Acho que é preciso chamar as pessoas e abrir o jogo com clareza, mostrando a missão da empresa e a missão de cada funcionário. Mostrar o que está acontecendo e conscientizar as pessoas sobre a realidade que se está vivendo. Em seguida, a empresa deveria dar um tempo para que cada um se reformulasse e até dar suporte para aqueles que queiram se reformular. Em última instância, se nenhuma atitude for tomada, a empresa fica isenta para tomar a atitude que for cabível.
Desde 1992, a empresa não está admitindo aeronautas, por causa da recessão. Houve corte de pessoal em 1994, mas os que foram demitidos já foram readmitidos, menos aqueles que tinham problemas em seus históricos. A empresa honrou as readmissões dos mais jovens, pois eles não têm esse problema da conscientização e têm outra postura. Os comissários do grupo de 8 a 14 anos de casa, com raras exceções, é que são o real problema. Ficou apontado na pesquisa que o nível de insatisfação profissional é maior e que, consequentemente, eles reagem negativamente, ficam ansiosos, comem demais e uma série de outras coisas.
Mudança na estrutura da empresa
Infelizmente, houve essa mudança na estrutura da empresa, com a fusão de duas diretorias (Operações e Serviço de Bordo), e só o futuro vai dizer se, estrategicamente, foi uma boa mudança. Integrar duas culturas tão diferentes, como a dos pilotos com a dos comissários, não vai ser tarefa fácil. Vai ser preciso um longo tempo para administrar todas as diferenças existentes. Acho que foi um erro estratégico porque a empresa não estava preparada para fazer a fusão dessas duas populações da maior importância para a sobrevivência da empresa.
A população de comissários tem que ter uma atenção especial, ou uma diretoria própria. Hoje, a prioridade está com os pilotos, pois os diretores da Diretoria de Operações são pilotos. Mas os problemas e as atividades dos pilotos e dos comissários são de diferentes naturezas. Lamento muito essa mudança, na medida em que o grupo de comissários precisa ser tratado de acordo com a natureza da sua profissão. E nesse aspecto o papel do psicólogo é muito importante, pois ele pode dar um suporte imenso, mas a empresa não está vendo assim. Agora eles vão contratar consultorias. Não é mais o profissional que conhece a cultura e o problema dos grupos de funcionários da empresa.

Perspectivas no trabalho
Não sei o que o está acontecendo hoje em dia, aqui na empresa. Quando fui para a Diretoria de Operações, como foi um grupo lá do CTC, o novo diretor falou sobre a importância de me manter na diretoria. Ele extinguiu os postos dos gerentes da gestão anterior e me manteve na diretoria, mas sem um espaço formal e funcional definido. Eu já estava muito madura para me sujeitar a essa situação de retrocesso profissional, pois gerenciava o Centro de Treinamento de Comissários em duas bases, Rio de Janeiro e São Paulo. Aquela situação ficou me incomodando e eu achei que tinha um potencial para contribuir em muito mais frentes. E disse para mim mesma: vou dar um tempo para que as coisas se ajustem, vou esperar. E nesse meio tempo veio o convite da diretoria de Recursos Humanos para eu cuidar da Pesquisa de Clima da empresa por inteiro. Era um convite irrecusável.
Entre o concreto e o incerto, e também pela questão da minha idade, porque já estou com 55 anos, faltando apenas três anos para me aposentar, escolhi o concreto porque ainda posso ser produtiva. Fui uma profissional privilegiada e, como psicóloga, poucos profissionais tiveram a carreira tão privilegiada quanto eu tive. Na Varig não conheço nenhum, nas três bases: Rio de janeiro, São Paulo e Porto Alegre. E acho que isso é resultado de trabalho, de dedicação e profissionalismo. As pessoas observam quem são os profissionais que se dedicam. E nesse sentido também acho que entrou um pouco a variável “sorte”. As pessoas me conheciam e achavam que eu tinha o perfil adequado.
Agora, a empresa avaliou a questão do custo-benefício em relação às pessoas que estariam com idade próxima da aposentadoria, pagando a integralização do AERUS, e eu fui convidada a me aposentar. Não vou ter perdas e achei que podia aceitar esse incentivo à aposentadoria antecipada. Vou analisar muito bem em que frente vou trabalhar: em uma empresa de consultoria ou se vou voltar a estudar. A Universidade Santa Úrsula parece que vai abrir um curso de Consultores que eu tenho interesse em fazer. Esse curso só tem em São Paulo ou nos Estados Unidos. É um curso para meu conhecimento pessoal, não para ter mais ganhos financeiros. É para me atualizar e atuar no mercado, e será um novo desafio.

Situação financeira
Para a média do brasileiro, acho que minha situação financeira está estabilizada. Em termos da mulher brasileira, estou muito acima da média. Tenho casa própria na zona sul do Rio de Janeiro. Moro numa vila, antiguinha e adoro minha casa. Tenho um carrinho bom, ano 1991. E não quero muito mais coisas que isso. Quando você é nova quer muito mais coisas; quando você é mais madura, quer menos, quer pouco. Eu sempre quis ter uma casa própria, um sonho que realizei. Sem um teto eu não me sentiria segura. Durante muitos anos dependi de aluguel e isso me preocupava muito. Hoje estou numa situação confortável e ainda tenho a aposentadoria facilitada pelo AERUS, que foi um grande ganho. Senão, apenas com o INSS ia ser difícil. Minha mãe é minha dependente e é uma pessoa doente; os custos de manutenção de um doente no Brasil são um pouco pesados. Então, se não fosse pelo AERUS eu não poderia manter o mesmo padrão. Mas não quero parar, quero estudar, fazer o que gosto.

Sonhos a realizar
Estou com 55 anos, mas não me vejo com essa idade. O tempo passou rapidíssimo e o tempo psicológico passou mais rápido ainda. Sinto-me saudável e com perspectivas de me realizar em outras áreas. Quero voltar a estudar francês, para o meu prazer. Gosto de teatro, literatura e psicologia e acho que são as três áreas com as quais me identifico. Gosto de lidar com o imaginário, com o não palpável, e estou muito a fim de estudar. Não conheço um profissional de psicologia que não goste de misticismo e das correntes esotéricas porque têm tudo a ver com a vida e o ser humano.
Além dos meus projetos de atualização, quero fazer trabalho voluntário no Instituto Benjamim Constant e dar uma hora por semana para os cegos. Quero ler para eles. Quem me falou desse trabalho foi um copiloto que sofreu um acidente seríssimo e fez avaliação comigo quando voltou para o voo. Durante sua licença, recomendaram esse trabalho voluntário, que ele continua fazendo até hoje. Fiquei muito interessada e ele me deu todas as informações. Essa é uma das coisas que prometi a mim mesma fazer. Qualquer pessoa que tenha tempo disponível pode ir lá, se inscrever, porque há muitos alunos e a única maneira deles aprenderem é através da leitura de alguém.
Então, como falou o psicólogo Eric Ericsson, quando você é mais maduro você se realiza sendo útil aos outros. Estou me aposentando da empresa, mas não da vida. Vou continuar e acho que vou ser altamente produtiva e realizada. A velhice é saudável quando a pessoa se sente realizada e ainda produtiva, e é doentia quando a pessoa não acredita que ainda pode fazer muitas coisas. Acho que a gente encerra um ciclo e inicia outro. Sempre tive uma relação apaixonada com o trabalho, assim como tenho uma relação apaixonada com minha filha.
Maternidade
Morei três anos no exterior, em Miami e em Nova York. Ainda estava na Faculdade e tive um convite de trabalho. Então, eu tranquei a minha matrícula e fui viver essa experiência de morar no estrangeiro. E foi lá que minha filha nasceu. Foi a melhor coisa que me aconteceu. O pai da minha filha é uma pessoa inteligentíssima; é um artista plástico de muito destaque nos EUA. Ele tem uma visão muito à frente do seu tempo e destoa do perfil americano por ser um artista. Nosso relacionamento foi o maior presente que tive na minha permanência por lá. Nós não nos casamos, mas somos amigos.
A filha foi uma produção independente. Resolvi assumir a gravidez, até por outra variável. Eu estava com limitação física e, na época, o médico me avisou: ou você tem essa criança ou não vai mais ter nenhuma. Então, não pensei duas vezes. Meu namorado artista foi muito compreensivo. Podia parecer até uma chantagem emocional, mas não era nada disso. Foi uma contingência. Se ele quisesse dar o nome para a filha seria ótimo, como deu, mas se não quisesse eu ia assumi-la de qualquer maneira.
Fui para os EUA com 32 anos e minha filha nasceu quando eu estava com 35. Estava amadurecida e bem consciente para assumir o papel de mãe. Tinha espaço para ela na minha vida. Quando se é muito jovem, ter filhos atrapalha muito a vida da pessoa. Não era o meu caso, eu estava preparada. Voltei para o Brasil com uma filhinha, uma americanazinha. Minha família é numerosa e minhas irmãs me ajudaram. Agora, a minha filha está morando e estudando nos Estados Unidos. Ela tem dupla nacionalidade e está cursando uma universidade.
Relacionamento com o sexo oposto
Meu único ponto fraco é com relação ao sexo oposto. Nunca consegui manter uma relação por muitos anos e tenho a maior admiração por quem consegue. É provável que a minha dedicação seja maior ao trabalho e os homens percebem isso. Se eu voltasse atrás no tempo, ficaria mais atenta, procuraria o equilíbrio porque todas as relações são fundamentais para a realização da mulher.
Ninguém é perfeito, mesmo assim, ainda espero encontrar alguém com mais afinidade e acho que as relações mais duradouras são as de cabeça. Um amigo disse, e eu concordo com ele, que uma relação a dois é o encontro de dois inconscientes. Quando a gente está mais disponível para o outro a relação se mantém. As separações acontecem quando alguém se sente lesado na relação, quando acha que não está tendo a atenção devida, ou quando está sendo cobrado demais.
Fazendo um balanço da minha vida, o sentimento de realização é muito maior que o de frustração. Em termos profissionais fui bem, e em relação à minha filha acho que também cumpri minha missão, meu papel. A única dificuldade que tive na vida foi essa, de investir no relacionamento com o sexo oposto. Mas ainda não perdi as esperanças. Hei de achar um coroa com a mesma afinidade que eu em um projeto de vida a dois.
Vida afetiva das Comissárias de Voo
Na relação com o sexo oposto, as mulheres aeronautas têm menos chances de serem felizes. Elas ainda lutam com essa variável, porque a questão do vínculo se estabelece e se mantém no dia-a-dia. Nessa relação, a quebra da continuidade é uma constante na vida das comissárias. Cada viagem é um afastamento e vai interrompendo o processo da relação. O companheiro faz cobranças, as mágoas vão se somando, e a mulher se sente devedora ou fica fantasiando coisas a respeito do outro. Sim, a mulher comissária tem uma grande sobrecarga, que não contribui para a sua felicidade pessoal.
Eu acho que não teria aguentado ficar no voo até os meus 55 anos, que é a idade limite para a aposentadoria das comissárias. Não teria a energia requerida e teria saído antes, de qualquer maneira. As que conseguem, no meu entendimento, são heroínas, supermulheres, principalmente as que, além da estrutura física, mantém uma boa estrutura psicológica.

*Susy (pseudônimo) se aposentou em 1995, aos 55 anos. Trabalhou como comissária de voo de 1964 até 1972. Depois trabalhou como Psicóloga. Esta entrevista foi concedida em 1996, no Rio de Janeiro.


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